Valorizar mais a formação dos professores
Não é fácil ser um bom professor. Na sala de aula, a respetiva eficácia resulta da combinação de conhecimentos científicos com competências pedagógicas e, claro, com bom senso e sensibilidade para os contextos. Querer simplificar requisitos de acesso à profissão, como é intenção do Ministério da Educação, pode ser muito arriscado.
Corpo do artigo
No próximo ano letivo, o Governo pretende rever as habilitações para a contratação direta de professores nas escolas. Por exemplo, na lecionação de Português e de Inglês, poderão estar licenciados pós-Bolonha, reduzindo-se os créditos requeridos nessa área para um patamar inferior àqueles reclamados para o ingresso num mestrado de ensino. Não faz muito sentido. No caso do Português, o que se ensina deve ir muito para além dos conteúdos programáticos, requerendo um domínio estrutural da língua, capaz de habilitar os alunos a bem falar e escrever. E isso demora tempo, porque exige do professor conhecimentos de linguística, de sintaxe, de fonética e, obviamente, leituras de obras de períodos distintos da nossa literatura. Ora, tais competências não se obtêm a partir de 80 créditos, como se pensa pedir.
Os sindicatos, que hoje se sentam à mesa com os responsáveis do Ministério da Educação, já tornaram públicas as suas reservas relativamente a esta decisão. No entanto, face à atual falta de professores e à proximidade do novo ano letivo, não existirá muita folga para caminhos mais exigentes, mas há tempo para outras políticas.
É, pois, imperioso valorizar a carreira docente. O contexto pandémico fez-nos perceber a enorme centralidade de um professor na vida das crianças. Precisamos de dignificar essa profissão, tão desvalorizada nos concursos de acesso ao Ensino Superior. As universidades necessitam também de operar uma revolução nos seus cursos de ensino a fim de lhes conferirem maior atratividade. Ministérios da Educação e do Ensino Superior deveriam criar sinergias e pôr em marcha um plano sistémico que prolongasse nas escolas básicas e secundárias o que se aprende nas universidades. Se é imperioso alterar profundamente as licenciaturas em ensino, é também urgente promover uma formação contínua mais assertiva nos conteúdos e mais moderna nos métodos.
Enquanto a revolução não chega e perante a necessidade de rever habilitações exigidas na contratação de novos professores, o Ministério da Educação deveria acautelar danos. Por exemplo, fazer acompanhar essa redução de exigências de um intenso programa de formação. Porque há uma geração para ensinar que, nos últimos dois anos, marcou passo na aprendizagem.
*Prof. associada com agregação da UMinho