Independentemente da geometria política, talvez a mais variável dos atos eleitorais dos últimos anos, há um valor inesgotável e intrínseco a todas as chamadas às urnas: o de podermos exercer aquele que é, simultaneamente, um direito e um dever.
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Escolhermos o que queremos para o nosso futuro coletivo da única forma possível em democracia: fazendo uma opção consciente e livre. Parece um princípio singelo este, mais do que assimilado, normal. Mas se há ensinamento a tirar da pandemia que ainda nos morde os calcanhares é o de que os sacrifícios que estivemos dispostos a efetuar em nome da saúde apequenaram o sacrossanto conceito de liberdade individual.
É, por isso, num quadro de reforçada exigência que somos chamados a votar. Com um milhão de cidadãos isolados, teremos de contar com mais esta deformação da amostra, a que juntamos o tradicional milhão de eleitores-fantasma que, eleição após eleição, vão vagueando pelos cadernos, como assombrações do regime. Não há votos de primeira nem de segunda, mas as eleições legislativas de amanhã encerram um contexto novo e desafiante: o de termos portugueses infetados com covid ou isolados devido à doença com capacidade de voto e de circulação.
É por isso que as somas e subtrações que possamos fazer ao que vale este ou aquele partido, ao que pode este ou aquele partido fazer se alcançar determinado resultado, constituirão sempre exercícios falíveis se não tivermos em conta esta parte gorda da equação. Se o país político que jurou fazer uma campanha contida se borrifou para as restrições, multiplicando arruadas e ajuntamentos de norte a sul , que o país real que detém o poder do voto não se acanhe também, mas que o faça de forma cuidadosa e responsável.
Sobra uma pergunta óbvia: de que forma a enorme massa de portugueses que se pode juntar, por força da pandemia, ao outro numeroso exército que nunca vê razões para votar irá contribuir para distorcer os dados finais e, mais uma vez, deixar os números da abstenção nos píncaros? Resposta possível: não sabemos. Resposta necessária: depende de nós, depende de si, contrariar essa fatalidade. Não pensemos em mais nada. Primeiro votemos, depois logo se vê.
*Diretor-adjunto