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A Venezuela é uma tragédia anunciada, desde há vários meses. O Governo populista de Nicolás Maduro, uma espécie de "genérico" de Hugo Chávez, conduz o país a um beco que só tem saída através de uma rutura, cujo formato prático ainda está por clarificar. Chávez era um demagogo com carisma, que aproveitou a riqueza do petróleo, que a Venezuela tem a rodos, para lançar generosas políticas sociais que lhe granjearam apoio de setores muito fustigados pelas profundas desigualdades que sempre marcaram o país. Porque a democracia, tal como a conhecemos nas nossas sociedades, não estava nas suas prioridades, Chávez instituiu um modelo político que fraturou progressivamente a sociedade, hostilizando quem se opunha ao meu megalómano projeto de instituir um "remake" da mitologia gloriosa de Bolívar. De caminho, viciou o país à monocultura petrolífera, que pagava as importações massivas e dispensava tudo o resto.
Chávez morreu. Sucedeu-lhe Maduro, que foi confrontado com a queda do preço do petróleo, ficando sem recursos para suportar as políticas públicas assentes num Estado pletórico, que diabolizara a iniciativa privada a arruinara o tecido económico. Sem o menor diálogo com a oposição política, Maduro optou pela bravata, acusando o "imperialismo" e os seus supostos aliados internos de todos os males do país. O passado já provou que a Direita venezuelana não é "flor que se cheire", mas a verdade é que o principal problema é a insustentabilidade prática do modelo chavista.
Esta crise política poderia ser idêntica a tantas outras que o Mundo tem, não fosse o caso de viver na Venezuela uma muito importante comunidade portuguesa, maioritariamente desafeta ao atual regime, que se teme possa vir a ser apanhada no fogo cruzado que um desfecho violento venha a originar. Há muito pouco que autonomamente possamos fazer, para além de monitorizar a situação, lado a lado com outros parceiros, nomeadamente europeus, agora que o Brasil perdeu conjunturalmente qualquer "leverage" no processo.
Há quem, retroativamente, aproveite para criticar o impulso dado por anteriores governos portugueses ao reforço dos laços económicos com a Venezuela de Chávez, realçando alguns negócios que a crise petrolífera não deixou que fossem para diante. É um erro pensar assim. Os dirigentes políticos, de Sócrates a Passos Coelho, fizeram o que deveriam ter feito: garantir às empresas contratos, que criaram aqui empregos e lucros, mesmo com os naturais riscos, ao mesmo tempo que procuraram sustentar o melhor ambiente político possível de diálogo com um país que acolhia largas dezenas de milhares de portugueses. Ou alguém já pensou no que, entretanto, poderia ter acontecido se acaso Lisboa tivesse atuado de outra forma?
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