Angela Merkl acha que a "união" da Europa passa também pela comunhão de hábitos laborais. Parece um princípio justo, se for considerado comum o que pode ser. Em certas profissões de desgaste rápido, a reforma tem de ser antecipada. Noutras, os períodos de férias podem ser repartidos, ou têm de ser gozados de forma unitária.
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E há a larga percentagem de pessoas, em toda a União, que estão auto-empregadas, ou trabalham em profissões liberais, e que portanto escolhem, por sua conta e risco, a aposentação e o descanso.
A objecção de Merkl não pode ser dirigida a Portugal, ou à Irlanda, onde as regras não são diferentes da Alemanha. Parece ser assim uma loucura querer interpretar o sermão como mais uma reguada numa Lusitânia miticamente sorna. E uma loucura maior culpar a chanceler pelos problemas do nosso desenvolvimento, que partem precisamente da falta de qualificação, da falta de produtividade, da falta de dignidade, da falta de sentido, da falta de sustentação, da falta de utilidade do trabalho, sempre trocado pelo conceito de "emprego".
Outra loucura é o diagnóstico sobre o FMI, depois do escândalo. Pode haver um braço-de-ferro entre Ocidente e os BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), mas o senhor Strauss-Kahn, por si só, não era nenhuma garantia "do euro contra o dólar".
Loucura é ainda a tese de conspiração sobre as causas do "suicídio moral" do rival de Sarkozy. Mas parece certo que, para muitos, a realidade é menos suportável do que a ficção.
Loucura, também, na discussão sobre privatizações e municípios, à beira das nossas eleições. O memorando com a troika estabelece um ponto de partida, mas não fornece todos os detalhes. Qualquer governo responsável pode privatizar, sem passar para o incerto aquilo que deve ser comum e permanente. E pode manter a descentralização verdadeira, que não se confunde com a reprodução - cara e inútil - do Estado central por milhares de pequenos imperadores.
Loucura, por fim, mas boa, exalada da Liga Europa. Equipas e público português deram exemplo de dignidade e civilização em Dublin. O jogo, como se apressa a observar a BBC, foi algo soporífero, mas teve espectáculo. E abre a porta a um tira-teimas ainda mais empolgante, entre Porto e Barcelona, dois motores de progresso, fora das capitais.