Os lares de idosos voltaram a ser notícia a propósito das condições de vida sub-humanas e humilhantes a que os responsáveis de alguns deles sujeitavam os seus utentes. As imagens televisivas exibiram situações de autênticas antecâmaras da morte! Idosos abandonados à sua sorte em salas sem quaisquer condições de conforto, corpos desnudados, olhares baços cansados daquela vida. Inimaginável! Inaceitável!
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Os idosos são nosso património imaterial e sem eles não se pode apreender e compreender o futuro. Como pode existir seres humanos tão medíocres que, por ganância e desprezo por aqueles de que recebem mensalidades e apoios estatais, atiram para o lixo outros seres humanos entregues ao seu cuidado e responsabilidade? Portugal é uma república soberana, baseada na dignidade humana. Proclama a CRP que uma das tarefas fundamentais do Estado é a promoção do bem-estar e a qualidade de vida do povo, sendo que o sistema de Segurança Social a que todos têm direito protege os cidadãos na doença, velhice, invalidez, viuvez e orfandade. Compete ao Estado apoiar e fiscalizar a actividade e o funcionamento das instituições particulares de solidariedade social e de outras de reconhecido interesse público com vista à prossecução do objectivo solidariedade social. Registe-se ainda que a CRP proclama o direito das pessoas idosas à segurança económica, condições de habitação, convívio familiar e comunitário, respeito pela sua autonomia pessoal, evitando o isolamento e a marginalidade social. Frontalmente violadoras destas normas atinentes aos direitos humanos dos mais idosos, os referidos lares e outros não sei quantos pelo país fora, actuando na ilegalidade levam os seus utentes à exaustão física e psíquica, com desprezo e indiferença pelo bem-estar daqueles, num quadro de morte anunciada. As leis ordinárias especificam os direitos e as obrigações dos lares da terceira idade, estabelecem regras imperativas relativas às condições de instalação, implantação, localização e funcionamento; a fiscalização a cargo do Estado e o regime contra-ordenacional, a adequação das instalações, condições de higiene e segurança, número máximo de residentes, adequação dos cuidados e serviços destinados à satisfação das necessidades destes, como a higiene pessoal, alimentação e administração de fármacos prescritos pelo médico. Com um quadro jurídico tão claro e completo, é inexplicável a quantidade de lares ilegais que funcionam por todo o pais, com todo o descaramento e à-vontade, tornando-nos a todos nós servos da vergonha, da tristeza e da revolta perante a vileza do tratamento a que os proprietários ou titulares submetem os indefesos e frágeis mais velhos. A punição destes desprezíveis responsáveis pela humilhação, isolamento e abandono não pode, em minha opinião, ficar-se por meras contra-ordenações. Nos casos mais graves e degradantes, há que impor a criminalização dos autores destes verdadeiros atentados à vida e à dignidade humana.
Ex-diretora do DCIAP