É o princípio do fim. Tenho quase a certeza que, algures, nas previsões de Nostradamus, havia referência à abolição de carnes vermelhas das cantinas universitárias como um dos primeiros sinais do Apocalipse.
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Se tem sido exagerada a reação ao anúncio da extinção da carne nas ementas da Universidade de Coimbra, é certo que o primeiro exagero partiu da instituição, que resolveu anunciar aos quatros ventos uma mudança de menu, como quem anuncia uma medida verdadeiramente revolucionária, do tipo "vamos proibir a utilização de ovos... nas praxes, porque é estúpido desperdiçar comida só para agredir caloiros". O anúncio do fim da carne de vaca é especialmente inútil porque ninguém ia dar pela falta dela. O cardápio com carne incluía certamente bolonhesa uma vez por mês e empadão no dia seguinte, para aproveitar os restos. Se abolissem os fritos talvez os estudantes estranhassem mais. Estudantes esses que já vieram manifestar o seu apoio à decisão da reitoria, solidariedade que não espanta, já que atualmente um dos sinais exteriores de coolness mais valorizados pela juventude é o vegetarianismo. Fumar já não é fixe, não comer fumados sim. O que melhora duplamente o ambiente. Ser visto pelos colegas a comer sandes de presunto é meio caminho andado para ser votado ao ostracismo (fica-se logo malvisto, pelos detratores da carne mas também do glúten). Quero ver como é que a Associação Académica de Coimbra vai reagir no dia em que se descobrir que o cultivo intensivo de cevada também é prejudicial para o planeta. Aposto que a erradicação da cerveja seria mais penosa. Abdicar de uma bolonhesa seca é bem mais fácil do que ter de passar a brindar com 7up. Há quem diga que foi um grande golpe de marketing da universidade, que assim atrairá mais jovens para Coimbra. Será que há assim tantos universitários a escolher o curso com base no que se come na cantina? "Ah, tinha média para entrar na Faculdade de Medicina de Lisboa, mas como ouvi dizer que a sopa lá é péssima, fui antes para Arquitetura Paisagista no Algarve. Os professores não são grande coisa, mas o arroz-doce é excelente". Claro que nem toda a gente embarcou sem pestanejar nesta ideia, e há até quem tenha resolvido promover um churrasco em frente à universidade, como forma de mostrar indignação (e de matar um ratito, em sentido metafórico). Se estiverem interessados, não marquem nada para 25 de novembro. Eu não vou. Não que não aprecie uma boa bifana, simplesmente não gosto de fazer pirraça. Organizar um barbecue nas barbas dos estudantes de Coimbra, que estão privados de novilho, é como ir comer bolos com creme ao lado de um obeso que está a fazer dieta. É feio e, sobretudo, perigoso. As pessoas quando têm fome fazem coisas impensáveis. Os licenciados da Universidade de Coimbra terão finalmente um motivo válido para cantar aquela do "Coimbra tem mais encanto na hora da despedida". Porque depois de quatro anos sem fincar o dente num bitoque devem estar ansiosos por ver a cidade pelas costas.
Esta celeuma surgiu na mesma semana em que Cristiano Ronaldo, numa entrevista a um canal britânico, partilhou a comovente história das senhoras que o alimentavam quando, com 11 ou 12 anos, e longe da família, em Lisboa, ia ao McDonald"s com os colegas pedir hambúrgueres. Reza a lenda que não há almoços grátis mas, naquela altura, no McDonald"s de Alvalade pelos vistos havia. E o troco chegou agora, 20 anos depois. Ronaldo diz que quer encontrar essas empregadas da cadeia de fast food, para lhes agradecer o que fizeram e para lhes oferecer um jantar (um Big Mac, provavelmente). Se há coisa que esta história prova, além de que "gentileza gera gentileza" e toda essa moral didática, é que a carne de vaca faz bem! Foi à base de carne picada que formámos o nosso maior atleta. E vejam como está, espadaúdo e cheio de saúde. Querem convencer-me agora de que carne de vaca serve para criar o melhor do Mundo mas, para nós, comuns mortais, não dá? Poupem-me. E poupem água também, e todo o tipo de recursos, para salvar o planeta. Isso sim. Que eu quero cá estar ainda muitos e bons anos a aplaudir golos do Ronaldo e a comer tornedós.
Humorista