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A saída de Rui Moreira de cena torna as próximas eleições autárquicas muito interessantes. Porque haverá, naturalmente, uma mudança nos órgãos autárquicos, mas também porque, sendo eleito por um movimento independente nele personalizado, faltará saber para onde vão os votos que o elegeram nos últimos três atos eleitorais (embora em 2021 já tenha perdido 10 mil eleitores que nele tinham confiado em 2017).
Uma primeira nota para a vergonhosa cobertura que a comunicação social tem feito, com uma parcialidade de bradar aos céus e que tenta induzir a bipolarização entre Pedro Duarte e Manuel Pizarro. Candidatos cujas iniciativas têm uma muito maior cobertura mediática, incluindo entrevistas só aos dois ou com níveis de destaque muito maiores e tentativas de debates televisivos só a dois (o que a CDU conseguiu impedir com as queixas que apresentou à ERC e à CNE). Esta parcialidade, que se justifica com a já costumeira aposta no bloco central de interesses, mostra bem o estado da nossa democracia.
Uma segunda nota para o facto de três candidatos se reivindicarem como herdeiros do moreirismo: Pedro Duarte, Manuel Pizarro e Filipe Araújo. Os dois primeiros por taticismo eleitoral (o PS e o PSD reduziram-se a mínimos perante Rui Moreira), embora estejam de acordo com as políticas seguidas. O terceiro com alguma legitimidade, dado que foi o vice-presidente de Rui Moreira durante os últimos oito anos - por isso, é inadmissível o cancelamento que a comunicação social lhe tem feito, designadamente as televisões, ao não o convidarem para os debates.
O deslizamento do PS para a direita (dois dos seus primeiros candidatos à câmara são antigos vereadores do PSD em Gondomar e em Viseu) e a fanfarronice de Pizarro, ao afirmar que "a maioria do moreirismo" está consigo, coloca a terceira nota: onde irá votar o eleitorado de Esquerda do PS?
Eleitorado que não se revê na cidade/negócio de Moreira. Que não aceita o fracasso da sua política habitacional (curiosamente, os responsáveis pelo pelouro da habitação de Rui Moreira em oito dos seus 12 anos de mandato são os dois primeiros candidatos do PS...). Que pretende pôr fim ao excesso de turismo. Que quer uma aposta num transporte público de qualidade. Será que este eleitorado de esquerda cairá na esparrela do chamado voto "útil", contribuindo para perpetuar o moreirismo sem Moreira? Ou preferirá eleger vereadores de esquerda (e, aí, a CDU é quem está mais bem colocada), para dar força a um projeto alternativo e para fazer frente a políticas que, objetivamente não resolveram os problemas das pessoas?