Após a estabilização da democracia, concluída com o ciclo de poder cavaquista - 85/95 - o PSD governou somente três dos quinze anos desde então volvidos. Nesse período teve sete presidentes - Fernando Nogueira, Rebelo de Sousa, Durão Barroso, Santana Lopes, Marques Mendes, Luís Filipe Menezes e Manuela Ferreira Leite.
Corpo do artigo
De todos esses só um chegou a Primeiro-Ministro e, mesmo assim, à custa de uma vitória escassa, contra um PS decapitado.
Desses seus sete presidentes, três foram copiosamente derrotados em actos eleitorais - Nogueira, Santana e Ferreira Leite e três nem sequer enfrentaram eleições nacionais pois foram digeridos pela sua crónica conflitualidade interna.
É neste quadro que deve ser reflectido o futuro do PSD e do País. Neste momento não está em causa a escolha de mais um líder, está sim em causa a formatação do futuro próximo da democracia portuguesa. Em termos de sistema e em termos de regime.
Em termos de sistema, porque a persistir este ciclo de poder socialista, a lógica bipolar da alternância democrática - hoje mais académica do que real, será substituída por uma outra. Uma lógica unipolar, centrada num partido central hegemónico - o PS - que irá governando numa dinâmica assente numa geometria politica.
Os últimos resultados eleitorais e as sondagens recentemente publicadas, traduzem-no de forma insofismável. Esta semana, no credível painel do Expresso, o super-acossado Eng. Sócrates aparece a ombrear em popularidade com Cavaco Silva e o PSD deixa o CDS aproximar-se para uma distância pouco superior a 10 pontos percentuais!
Em termos de regime, porque a crise prolongada do actual sistema de partidos somada aos sofríveis resultados da governação, vão empurrar muita boa gente para o repensar da fragilidade do actual sistema semi-presidencial, empurrando-o para soluções mais musculadas de cariz presidencial.
Contudo, como já muitas vezes referi, nomeadamente enquanto líder do PSD, o problema nuclear do ainda maior partido da oposição não é somente o da estabilização de uma liderança forte. É, antes disso, o da erradicação dos factores que impedem que tal aconteça. Clarificação ideológica, perenidade de propostas de soluções programáticas governativas, modernização organizativa, aprofundamento da democraticidade interna, são questões que obrigam a clarificações inadiáveis.
Neste contexto, não me submeto, como nunca o fiz em momentos difíceis, à hipocrisia da omissão. Tenho uma derradeira esperança de ver o meu partido regenerar-se, utilizando instrumentalmente uma nova presidência.
Conheço os três principais candidatos. Todos eles, cada um à sua maneira, foram adversários contundentes do meu consulado à frente do partido. Só que dois deles, fizeram-no desde o primeiro minuto, de forma coerente e clara, enquanto que o terceiro só passou para a oposição após não ter visto o seu entusiástico apoio inicial devidamente recompensado.
Para mim, para além da preparação técnica e política, as características de personalidade e os traços de carácter são o fermento fundamental de um líder.
Não posso apoiar o Dr. Paulo Rangel porque não me revejo na forma como descolou das responsabilidades políticas do ciclo Ferreira Leite, quando se sabe que, com Pacheco Pereira, foi um dos mentores da suicida estratégia de Setembro passado.
Não o posso apoiar porque o mérito de uma campanha positiva, não o devia inibir de assumir a humildade de quem entende que a vitória das europeia foi uma vitória partidária, com base num voto de castigo habitual nestas circunstâncias. Desde a década de 80 o maior partido da oposição, em Portugal e na Europa, vence quase sempre eleições intercalares europeias, independentemente de quem comanda as suas listas.
Não o posso apoiar também, porque considero que, apesar dos direitos dos militantes não se medirem por anos de cartazes colados, é necessário um mínimo de pousio para se compreender a idiossincrasia da família e ter-se a certeza que a ela se pertence. Sei que a seu favor tem referido que o facto de ter sido até há pouco militante do CDS não era um facto relevante já que, por exemplo, relevantes militantes como Durão Barroso, tinham chegado da esquerda e Lucas Pires da direita. É verdade, só que o primeiro mudou de ares aos dezoito anos e não aos quarenta, quando a personalidade já está bem sedimentada.
Não o posso apoiar porque me desiludiu quando omitiu e aligeirou responsabilidades em matérias para que expressamente o mandatei, como o da defesa das correctas posições de Cavaco Silva, como a do Estatuto dos Açores.
Aguiar Branco é um grande militante, um homem íntegro, um bom companheiro. Tem sido um excelente líder parlamentar. Estivemos quase sempre em barricadas antagónicas, com a excepção de um breve período de apoio a Francisco Pinto Balsemão. Tal nunca beliscou a nossa amizade pessoal. Considero-o muito, mas entrou mal nesta corrida. Quando se deixou "ultrapassar!" por Rangel, quando se deixou apagar por Ferreira Leite, quando achou que agressividade verbal seria uma forma de recuperar terreno.
Ficou cedo fora da corrida, mas é alguém que merece ter um futuro partidário útil. O PSD ganhará com isso.
Finalmente Passos Coelho.
É nele que vou votar. Não é meu amigo íntimo e nunca me apoiou politicamente no partido. Mas quero acreditar nele. Na sua vontade de liderar, sem ser empurrado, por iniciativa própria. Na sua juventude tranquila e experiente, no carácter de que começando na política a soube abandonar para se valorizar academicamente e afirmar profissionalmente, de quem tem uma base de apoio popular, mas caldeada com o apoio de quadros superiores relevantes - fazendo neste particular um interessante "rassemblement" partidário (falo do apoio de gente tão diversa como Nogueira Leite, Paula Teixeira da Cruz ou Ferreira do Amaral).
Espero vê-lo vencer e tenho esperança que traga a esperança de que o país tanto necessita.
Aceitarei lealmente o veredicto dos militantes, seja ele qual for, e pelo que já lutei e sofri de ataques alheios, tenho a autoridade de pedir paz para o próximo líder.
Se assim for, todos voltaremos a ter um espaço de afirmação próprio no PSD. Todos? Bem, todos, talvez não. Acho que estamos na altura de expurgar - não pela expulsão, mas pelo abandono ao ostracismo, todos os que ainda vivem saudosos da ditadura e do estalinismo combatente; os que viram as setas do PSD ao contrário, em sinal de luto, quando os militantes não seguem os seus desejos.