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Como é da praxe, as forças partidárias dominantes num sistema bipolarizado entram na última semana de campanha a pedir a maioria absoluta. PSD/CDS e PS não fazem por menos, mesmo considerando sondagens que os colocam longe desse objetivo. As eleições de 4 de outubro são especiais para Portugal. Desta vez, mais do que nunca, os portugueses são colocados perante duas abordagens bem distintas à governação. E a dois candidatos a primeiro-ministro diferentes como a água do vinho.
O atual primeiro-ministro é a cara da austeridade e do ultraliberalismo, alguém que vê no Estado algo quase pecaminoso. Governou quatro anos e, diga-se a verdade, os eleitores têm nesse seu currículo uma sólida base para tomar uma decisão. Ao afirmar que os custos do trabalho não foram ainda suficientemente desvalorizados, Passos Coelho passa a mensagem de que a sua tarefa não está terminada, o que significa que não vai mudar. Desenganem-se os que pensam que haveria mais economia e menos finanças nos tempos próximos, caso a coligação ganhasse.
Do lado de António Costa, é maior a esperança de mudança, mas também a incógnita. Este é um líder que acredita no Estado social e na necessidade de aliviar a austeridade para dar espaço para a economia respirar e, assim, crescer. Para Costa, o emprego é um desígnio e não uma consequência. Nada tem a ver com as derivas do investimento público de sustentabilidade duvidosa que, no passado, socialistas (e sociais-democratas) adotaram. A sua proposta tem o potencial de fidelizar os seus apoiantes naturais, mas também os descontentes da governação de Passos.
A eleição de 4 de outubro traz ainda um desafio adicional, que decorre de um contexto internacional que promete não dar tréguas. A Grécia, a Finlândia, o recuo de algumas economias emergentes, a bolsa chinesa, os refugiados, a VW, entre outras, são ameaças que exigem, do nosso lado, estabilidade e rumo na governação. Formar um governo minoritário, que cairia no espaço de um ano, acarreta riscos muito altos. Há, portanto, que fazer opções. E aqui entra o voto útil, numa geometria que não favorece muito a coligação do governo, cujo eleitorado pode apenas ir beber aos indecisos. Do lado socialista, e por muito que isso custe a comunistas e bloquistas, há latitude para agregar os votos à sua esquerda, justamente aqueles que, mesmo tendo dúvidas sobre Costa, não se equivocam sobre a necessidade de substituir Passos.
Na reta final da campanha, os eleitores estão já cansados da demagogia e das meias-verdades. É tempo de decidir. De dar utilidade ao voto.