Portugal ainda se pode orgulhar de ter um dos melhores sistemas de saúde do Mundo. Indicadores importantes como "mortalidade infantil" ou "esperança média de vida ao nascimento", entre muitos outros, continuam a apresentar bons resultados. Há que reconhecer que estes bons resultados são fruto da criação do SNS - Serviço Nacional de Saúde nos anos 70 do século passado, e são também o corolário de um processo de continuidade assegurado pelos governos sucessivos desde essa altura.
Corpo do artigo
Foi assim realizado um longo e cuidadoso caminho, que acabou por garantir aos portugueses serviços de saúde com níveis de acesso, qualidade e segurança muito acima da média mundial. Em grande medida, este efeito positivo ficou a dever-se àquilo que defino como três fatores críticos de sucesso do SNS.
1. Mudanças adaptativas: Os diferentes governos, ao longo dos tempos, souberam ser suficientemente flexíveis para irem introduzindo no SNS mudanças adaptativas em função da realidade do país, à medida em que esta também se foi modificando.
2. Princípio da Complementaridade: A certa altura, para que continuasse a ser possível assegurar aos portugueses cuidados de saúde com equidade, houve a necessidade de se poder contar com a participação complementar dos setores social e privado, e os sucessivos governos foram capazes de, pelo bem maior de servir os cidadãos, abdicar de fundamentalismos ideológicos e estatizantes.
3. Governação não disruptiva: Os sucessivos governos embora de diferentes partidos, e naturalmente inspirados por distintas ideologias políticas, souberam manter uma certa continuidade estrutural. Ou seja, o governo que se seguiu a outro, não alterou significativamente o que o anterior tinha feito.
Mais recentemente, estes três fatores tacita e tradicionalmente respeitados deixaram de o ser, e a consequência está bem evidente na realidade atual. Os hospitais a quem anularam as parcerias público-privadas passaram a custar muito mais ao Estado, e a qualidade dos seus serviços baixou significativamente. Apareceram os problemas com serviços de obstetrícia, de pediatria, de urgência, etc., etc. e assistimos ainda a um marcado êxodo de médicos altamente diferenciados para fora do setor público. Aumentou o número de pessoas sem médico de família - de 7,2% em 2019 para 11,2% em 2021, uma subida de 4 pontos percentuais em apenas dois anos - e o número de cidadãos que aguardam vaga para integrar a Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados cresceu 88% entre 2019 e 2022. O SNS, e o sistema de saúde no seu todo, precisam de mudanças de visão estratégica e de empenho, sem preconceitos ideológicos. Só assim será possível melhorar a sua capacidade assistencialista e assegurar a sua resiliência e sustentabilidade futuras.
Neste contexto, há três fatores a ter em conta: a fuga em curso de profissionais de saúde, a falta de equidade de acesso e a necessidade de um novo modelo de gestão que utilize da melhor maneira os recursos existentes.
Ainda assim, é possível voltar ao grupo dos melhores!
Médico