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SCUT. Sem custo para o utilizador. CCNUT. Com custo para o não utilizador. Nunca viu este acrónimo e, no entanto, entre os dois, o segundo é mais certo do que o primeiro. Gostamos de imaginar que ainda há coisas de graça, livres. A retórica estatizante viciou-nos nisso. A educação, a saúde. Pilares do estado social, o amor redescoberto do primeiro-ministro. Os neoliberais querem-nos pôr a pagar esses serviços essenciais. Com ele, com a esquerda à moda dele, nunca tal sucederá.
Com este tipo de discurso não admira que as pessoas não percebam o verdadeiro espartilho em que estamos metidos, nem as consequências de algumas das decisões tomadas pelos políticos. Não percebem os custos e, depois, não percebem a necessidade de os pagar, pela via dos impostos.
Caricaturando, dir-se-ia que para assegurar que a educação continua gratuita, o PM está disposto a suportar todos os custos. A educação grátis custa, por ano, a cada português, em média, cerca de 700 euros. Dividindo por todos. Visto de outro ângulo, cada um dos cerca de 1,9 milhões de alunos que frequentam os vários níveis de ensino estatal custa, em média, quase 3 700 euros por ano. Costuma-se dizer que o que é de graça não tem valor. Mesmo sem entrar em detalhes, talvez se estes números fossem divulgados, se passasse a atribuir mais valor à educação. Um exercício semelhante pode ser feito para a saúde. Os custos, nesse caso, são um pouco mais elevados: 900 euros por português. Esteja ou não doente.
Não discuto se é muito ou pouco. Digo que é preciso as pessoas perceberem que estes serviços que lhes são disponibilizados a custo zero, ou quase, têm, afinal, um "preço". Que tem de ser pago, por alguém, pela via dos impostos.
Diz o PM que, se a tal solução neoliberal fosse para diante, as pessoas ao poderem escolher poriam em causa o financiamento do serviço público. Maior confissão de falta de confiança na qualidade da oferta pública, na educação ou na saúde, não podia ser feita! Na verdade, os ricos não são estúpidos. Na educação, como na saúde, como em tudo, escolherão com base na qualidade e na sua relação com o preço. Se os serviços públicos forem melhores, qual a razão para não os usar? Ao contrário do que pensam alguns arautos desta esquerda, no quotidiano as pessoas não decidem com base na ideologia mas em critérios racionais.
Neste seu discurso recauchutado à esquerda, o PM revela que essa não é a sua maneira de pensar, tantas são as fragilidades da sua argumentação. Ao defender o estado social, da forma como o fez, o PM patrocina o aparelho de estado. O social é apenas adjectivo. Os meios sobrepõem-se aos fins. Sócrates rende-se, em definitivo, aos interesses instalados. Dá cobertura à lógica monopolista dos serviços públicos. Abdica da sua costela reformista e aliena o aliado tácito que, nesse desiderato, decorria de submeter os serviços públicos à comparação com os privados. O ministro das finanças que arranje receitas para o monstro. Se a prática vier a ser consequente com o discurso, é caso para dizer que Sócrates é, cada vez mais, um "yesterday man".