Nos últimos dias, ficámos a saber mais pormenores sobre o programa ZER: Zona de Emissões Reduzidas, que vai ser implementado em breve em Lisboa, mais concretamente na zona da Baixa/Chiado.
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Lisboa é a Capital Verde Europeia 2020, um galardão que, pelos vistos, não serve para distinguir cidades com excelentes práticas, mas sim para castigar aquelas que ainda não o fazem. É uma espécie de ralhete: "não és ainda verde o suficiente, por isso vou obrigar-te a ser a capital favorita da Greta em 2020". A medida que tem gerado mais celeuma é a de limitar as visitas que cada um dos moradores do centro recebe em casa. Têm direito a 10 convites por mês. Ou seja, poderão dar oportunidade a dez amigos automobilistas de entrarem no perímetro reservado, uma espécie de zona VIP lisboeta, para os visitarem. Fiquei imediatamente com vontade de adquirir um imóvel lá. É a desculpa perfeita para um antissocial como eu. "Adorava convidar-vos para jantar, mas não posso, já gastei o meu plafond de visitas de fevereiro". E poderia gastá-lo todo com estafetas da Amazon, porque os serviços de entregas ou reparações estão incluídos neste lote exclusivo... (vá lá que ambulâncias, bombeiros e carros funerários não são contabilizados, que sorte!). Portanto, imaginemos um morador cujo filho faz anos, e selecionou dez amiguinhos da escola para irem lá a casa soprar as velas no bolo da Patrulha Pata... de repente rebenta um cano, a mãe tem de chamar de urgência um canalizador, e o pequeno António tem de escolher qual dos colegas vai desconvidar. Quer dizer, se algum dos encarregados de educação conduzir um automóvel anterior a 2000 está desde logo excluído. Sim, eu sei o que me dirão: podem ir a pé. Ou de transportes. Mas tendo em conta o funcionamento dos autocarros na cidade, o mais certo é chegarem só no fim da festa. Se vierem de elétrico, talvez cheguem mais rápido, mas certamente sem carteira. É da maneira que não gastam dinheiro em porcarias poluentes! Quando se discutem estas medidas, há sempre quem nos atire à cara o exemplo de outras capitais europeias. Mas lá não há Carris, nem STCP. Temos este hábito de copiar as coisas só pela metade. Vamos ser tão evoluídos como eles, mas continuará a ser ficção científica para nós aquela história dos políticos noruegueses que vão de bicicleta ou autocarro para o trabalho, em vez de terem uma frota automóvel constituída por 37 veículos topo de gama. Também a propósito da Capital Verde, ficou decidido que os ministros se deslocariam dentro de Lisboa só em automóveis elétricos. Mais uma bonita medida de maquilhagem (daquela que não é testada em animais), que nos deixa bem na fotografia, mas não estaremos com isto a poluir mais, se cada ministro passar a ter dois carros, um para dar umas voltinhas pela cidade, outro para se deslocar a outras regiões do país?!
Os moradores do centro que queiram utilizar os tais convites terão de os solicitar através de uma app, ou por telefone, indicando as matrículas dos visitantes. Quando ouvi falar em "Big Brother 2020", pensei que era um novo (velho) programa apresentado pela Teresa Guilherme. Afinal, é este programa de Fernando Medina. Só falta ter de indicar, além da matrícula, o que é que as pessoas vêm fazer e de que assuntos vão falar. Isto fez-me pensar no que serão as nossas cidades do futuro. E por futuro entenda-se daqui a dois ou três anos, quando também o Porto, Guimarães, Braga ou Coimbra caírem no engodo da "capital verde", e Portugal for decretado o país mais verde do Mundo.
O cidadão acorda, lembra-se de que convidou uns amigos para jantar, e começa a tratar dos procedimentos exigidos. Faz login na app, submete a matrícula, depois envia um e-mail para o Ministério do Ambiente avisando de que pretende servir uma refeição não vegana (uma das três a que tem direito por ano), paga a respetiva multa se comprar algum alimento em invólucro de plástico, e no final do jantar liga para um técnico da Câmara que vai lá a casa confirmar que foi feita a separação do lixo e iniciado o processo de compostagem com os restos. Em cada verificação destas ganha um selo, e quando chegar aos dez receberá uma viagem de tuque-tuque, com um guia que inventa episódios da história de Portugal num inglês macarrónico. Sim, porque os tuque-tuques continuarão a poder circular nos centros das cidades. Em Lisboa, por exemplo, serão sorteados os 104 que terão direito a andar nas zonas interditas a carros. Poluem um bocadinho, é certo, mas corríamos o risco de deixar os turistas amuados, se não pudessem ir de tuque-tuque até à loja que vende pastéis de bacalhau com queijo da serra.
20 VALORES
Para os portugueses que, no espaço de uma semana, vão conseguir acompanhar com igual fervor a final do Superbowl e a noite dos Oscars. Trata-se de gente que perde preciosas horas de sono para sentir que está a viver o sonho americano. Um "vá para fora cá dentro" que só ficará completo na próxima sexta-feira, quando festejarem o São Valentim pagando balúrdios por um hambúrguer em forma de coração.
*HUMORISTA
