Carvalho da SilvaVoltar a tramar os professores?Temos ouvido o primeiro-ministro (PM) afirmar, sobretudo a propósito da luta dos professores, que não existem direitos e valores absolutos. Contra um direito ou um valor, social e constitucionalmente reconhecidos, há sempre, segundo ele, outro que se alevanta podendo bloquear a realização do primeiro. Trata-se de uma formulação muito vulgar entre juristas e não se lhe pode negar relevância. Acontece, porém, que tal fórmula utilizada de forma oportunista se traduz - no ápice com que o diabo esfrega um olho - num comércio, sem princípios, dos direitos e dos valores.
Carvalho da SilvaA instituição emergênciaTenho afirmado que a palavra crise se tornou uma das instituições mais poderosas à escala global e no quotidiano da vida dos portugueses. A invocação de crises serve para justificar políticas oportunistas que vão sendo adotadas, com destaque para as que mais sacrifícios impõem aos trabalhadores e aos povos. Relembro esta perspetiva porque a revisão da Constituição da República (CR) em curso pode significar, em áreas sensíveis, a passagem da institucionalização das crises para a normalização das emergências. Diz-se que para facilitar as "respostas às crises".
Carvalho da SilvaPlanear para desenvolverEntre as vítimas mais relevantes do neoliberalismo conta-se o planeamento. No maniqueísmo de que se alimentam as teses neoliberais, tudo o que é planeado distorce o sagrado mercado. Ora, planear faz parte de uma abordagem estratégica às atividades da vida. Planeia-se um acontecimento relevante na vida pessoal ou na vida coletiva, um investimento privado ou público a que se dá importância, um rumo para a ação do Estado. Planeamento não é algo que só incumba ao Estado, mas não existe boa governação sem ele.
Carvalho da SilvaÉtica: no público e no privadoMuito se tem escrito e dito sobre a necessidade de escrutínio rigoroso aos governantes e aos servidores públicos. Uma abordagem séria sobre as práticas a adotar para tratar esta delicada matéria constituirá um exercício de grande importância para a qualidade da governação e para a democracia. Contudo, os problemas em causa não se situam apenas na esfera pública. A sociedade funciona com sistemas complexos de vasos comunicantes entre o público e o privado. O escrutínio e a exigência de princípios éticos não podem ser barrados na porta das empresas ou de organizações não públicas.
Carvalho da SilvaNão dar o ouro ao bandidoO lamaçal político que se vem formando na vida política portuguesa pode provocar uma acelerada erosão da confiança dos portugueses no Governo e perigos para a democracia. Se o primeiro-ministro não quiser reconhecer os seus erros, focar-se nas respostas aos problemas das pessoas e do país e abandonar vícios negativos - se for um problema de húbris será difícil -, e se o Partido Socialista (PS) não for capaz de estancar a incompetência, a incúria e cegueira que marcam vários planos da governação, o cheiro a traição política começará a ser forte.
Carvalho da SilvaNo atoleiro neoliberalOs governos capazes de resolver grandes problemas com que se deparam as pessoas e os países não são suportados por maiorias absolutas, mas sim por compromissos entre forças políticas portadoras de programas diferenciados, dispostas a uma trabalhosa negociação contínua.
Carvalho da SilvaSol na eira e chuva no nabalTrata-se de um fenómeno quase impossível e quando acontece é momentâneo. Adolescente, observei essa quase impossibilidade quando, à porta da cozinha da casa dos meus pais (agricultores), olhava em simultâneo a eira e o eido, num dia de mais sol que chuva e com nuvens esparsas. Por uns instantes, a chuva caía no nabal e o sol beijava a eira. Foram apenas uns curtos segundos.
Carvalho da SilvaPetróleo para a fogueiraNeste final de ano, a grande medida política anunciada pelo Governo português e a avançada pelo Banco Central Europeu (BCE), podendo não parecer, têm um traço comum: as duas constituem experimentações perigosas, que perspetivam o lançamento de mais petróleo na fogueira dos sacrifícios a impor aos trabalhadores e aos povos, nos tempos próximos.
Carvalho da SilvaO Conselho Económico e SocialO Conselho Económico e Social (CES) completou este ano 30 anos de vida. Francisco Assis, seu atual presidente, assumiu, publicamente, desde 2021, que a melhor forma de assinalar essa efeméride seria "fomentar a reflexão e o debate sobre o papel do CES na sociedade portuguesa" (Lusa, 17/8/2021), objetivo que à partida será louvável, se o exercício for rigoroso, designadamente na identificação do que é sociedade civil (CES) e do que é Comissão Permanente de Concertação Social (CPCS). Segundo essa notícia, Assis "encarregou o académico Miguel Poiares Maduro de coordenar esse trabalho".
Carvalho da SilvaLisboa polida, mas a esvaziar-seLisboa cidade, o seu concelho e a sua Área Metropolitana sofreram, em menos de duas décadas, transformações profundas que tolhem o seu processo de desenvolvimento. Os efeitos da crise da austeridade do início da década anterior foram aprofundados e ampliados pelos da "grande paragem" de 2020/2021, a nova crise que emergiu da pandemia. Os impactos cumulativos destas duas crises constituem-se como um ciclo recessivo que atingiu toda a estrutura socioeconómica da metrópole, já anteriormente marcada por desigualdades e fragilidades acumuladas num tempo longo.
Carvalho da SilvaTentemos ser jovensHá sempre possibilidade de abrir caminhos à esperança, ao futuro. Os movimentos dos jovens contra as causas das alterações climáticas e ambientais provam-no. A politização da juventude é da máxima importância para atingir aquele objetivo. Os jovens irão descobrindo formas de lá chegar. Não poderão dispensar a memória, mas serão eles os construtores mais responsáveis: a vida abre-se-lhes por muito tempo. Aos mais velhos compete tentar ser jovens, ou seja, assumir o futuro como presente contínuo - onde as gerações todas se encontram - e darem um contributo prospetivo com humildade.
Carvalho da SilvaSegurança Social bonsai?No grande debate sobre o futuro da Segurança Social, realizado em 1997, a tese da insustentabilidade do sistema público, universal e solidário de que os portugueses dispõem foi esgrimida com força, e também marcou presença aquando da última reforma realizada há 16 anos. O tempo mostrou que essas teses catastrofistas não tinham cabimento e que algumas amputações de direitos para gerações futuras não deviam ter sido feitas. O sistema comportou-se com uma solidez bem maior que o vaticinado.
Carvalho da SilvaLoucuras e desnortesA ganância, o egoísmo e a sobranceria cegam e enlouquecem. É isto que vemos desde a escala global à nacional. Na Cimeira do Clima das Nações Unidas (COP27), que está a decorrer no Egito, António Guterres alerta-nos que "estamos numa autoestrada para o inferno", enquanto dirigentes políticos de diversas latitudes juram, pela enésima vez, que agora é a sério o seu combate às alterações climáticas. Todavia, a realidade evidencia aumento das preocupações e reduz a esperança.
Carvalho da SilvaA (des)igualdade salarialFoi assinalado ontem, dia 4, o Dia Europeu da Igualdade Salarial, data a partir da qual, simbolicamente, o trabalho das mulheres deixa de ser remunerado até ao último dia do ano. A diferença salarial em função do género (há outras desigualdades no trabalho), ou seja, por discriminação das mulheres, corresponde neste ano a 58 dias. Dito de outra forma, as mulheres trabalhadoras, da globalidade dos estados-membros da União Europeia, auferem retribuições 16% inferiores às dos homens. E tudo o que representa a dupla jornada de trabalho feminina agravaria este cenário.
Carvalho da SilvaPara onde vais, Brasil?No início da madrugada de segunda-feira saberemos quem será o próximo presidente da República do Brasil, país com o dobro da superfície da União Europeia e bastantes recursos naturais, o sexto mais populoso do Mundo, a 12.ª maior economia.
Carvalho da SilvaPerigosas loucurasQuando se discutem as grandes questões ambientais globais como a poluição do ar e as mudanças climáticas que lhe estão associadas; a imensa produção de resíduos provocada pelo estilo de vida dominante que degrada os solos, os mares e a atmosfera; a falta de água potável; o acelerado desmatamento e outros atos contra a natureza que levam à extinção de espécies; ou os perigos da manipulação genética - assustamo-nos com os impactos socioambientais gerados. No contexto atual, esses medos ampliam-se.
Carvalho da SilvaOrçamento: hoje explico euNo "Acordo de Médio Prazo" estabelecido na Concertação Social, peça importante do Orçamento do Estado (OE) para 2023, foi retomado pelo Governo o compromisso de "aumentar o peso dos salários no PIB de 45% para 48% até 2026". Tal meta, a ser cumprida, apenas nos aproximaria da média europeia, mas seria muito importante para o desenvolvimento do país em vários campos. Ora, considerando o baixo perfil de especialização da nossa economia, o vício em se resolverem problemas no setor privado e na Administração Pública (AP) cortando salários, aquele objetivo exige o esforço de uma maratona. Como é que António Costa nos propõe que ela seja feita?
Carvalho da SilvaBons ventos e bons casamentosEnquanto por cá se discutem descidas do IRC e alguns setores empresariais procuram garantir - e parece que vão conseguir - ampliar o generoso sistema de isenções e benefícios fiscais de que beneficiam, em Espanha é esperado um aumento da coleta fiscal de 7,7% obtido à custa de "novas figuras tributárias", isto é, de novos impostos sobre lucros extraordinários da banca, das energéticas e, ainda, sobre patrimónios de mais de três milhões de euros e de rendimentos de mais de 200 000 euros por ano. É assim que o Estado espanhol obtém recursos adicionais para financiar políticas sociais.
Carvalho da SilvaRetirar pedras do caminhoA presidente do Banco Central Europeu (BCE), representação máxima europeia do poder financeiro (independente da Democracia) ralhou forte e, sem dó nem piedade, aumentou a taxa de juro e ameaçou outros aumentos. Empenhada na criação de uma recessão económica, ela não tolera governos que, por vontade própria ou para se manterem no poder, procuram responder a problemas prementes com que os cidadãos se deparam. Para ela, os governos devem conduzir os povos à emulação salvífica pelo sacrifício.
Carvalho da SilvaNão há futuro sem presenteO futuro depende, em grande medida, das respostas que se conseguem dar no presente, que é contínuo. Mesmo no contexto de revoluções, o tempo propiciador de avanços extraordinários é muito curto. Por isso, habituei-me a acreditar em quem aconselha: se queres um bom futuro, trata eficazmente do presente.
Carvalho da SilvaPromessas leva-as o ventoO primeiro-ministro (PM) tem colocado expectativa num hipotético Acordo de Política de Rendimentos, em discussão na Concertação Social. Que contributo esperar dessa discussão, para a melhoria estrutural da economia e das condições de vida? Os trabalhadores e os reformados, que vêm perdendo rendimentos aceleradamente, vão ver essa situação invertida?
Carvalho da SilvaA minar a confiançaÀ luz da sua génese e dos seus compromissos eleitorais e programáticos, o primeiro-ministro e o seu Governo estão a destruir o seu capital de confiança, a ampliar suspeições sobre instrumentos fundamentais do Estado Social de direito democrático, como são o Serviço Nacional de Saúde e o sistema público, universal e solidário da Segurança Social, a contribuir para o aumento de descrédito na democracia. Esta não sobrevive sem verdade, rigor nas propostas do Governo e de todas as instituições que contribuem para a governação do país.
Carvalho da SilvaÉ feio e é perigosoO linchamento da ministra Marta Temido - não tenho aqui a pretensão de analisar o positivo e negativo da sua ação - foi trabalhado ardilosamente, num quadro em que o Governo devia estar a implementar a nova Lei de Bases da Saúde, a negociar com os sindicatos as carreiras dos seus profissionais, a reforçar o investimento no setor, a corrigir decisões erradas em que se deixou envolver na gestão das urgências ou da organização do subsetor da Obstetrícia.
Carvalho da SilvaVencer medos, reaver utopiasEstamos a viver um estio de duras securas e incêndios em vários campos, desde o climático ao da governação global, europeia e nacional. Este é, provavelmente, o ano em que mais sentimos a gravidade dos problemas climáticos e ambientais. Pensar nos desafios que se colocam às gerações jovens assusta. Todavia, existem meios tecnológicos e científicos que, investidos numa equilibrada relação metabólica Homem/Sociedade/Natureza, podem trazer algumas soluções.
Carvalho da SilvaPrecariedade é sobre-exploraçãoA precariedade no trabalho é uma grave doença social, económica e cultural. Todas as dimensões da vida das pessoas/trabalhadores, e por consequência das famílias, são atingidas negativamente por ela. São imensas as áreas e temas de estudo que o comprovam.