A capacidade da ubiquidade é a faculdade divina de estar concomitantemente presente em toda parte. Neste nosso mundo não faltam seres capazes deste prodígio metafisico e que nos deixam menosprezados perante a nossa incapacidade de conseguir atingir tal proeza. Mas vamos a factos concretos. Quando temos um cidadão que tem como responsabilidade política um determinado cargo no governo, a título de exemplo, esse comprometimento não começa às oito da manhã e termina às cinco da tarde! Não, de forma alguma. Um membro do governo (e aqui poderia alargar para outras estruturas individuais publicas, privadas e sociais), é sempre membro do governo enquanto for titular dessa responsabilidade. Não pode "vestir um casaco" de manhã e de tarde "mudar de casaco" porque quer deixar de ser membro do governo e passar a ser outra coisa qualquer. Isto porque são cargos indissociáveis da pessoa, responsabilidades únicas e que o vão acompanhar nesse percurso independentemente do dia, da hora e do local. Como tal, tem de existir bom senso, respeito por si próprio e pelos outros, e a inteligência de saber assumir que não pode dizer que agora não fala como membro do governo, mas sim como militante do partido A ou B. Isso é uma falácia, uma mentira (pois não deixou de ser membro do governo) que está a perpetrar junto da sociedade e da opinião pública. Cabe na cabeça de alguém que, um individuo que veja um ministro a falar sobre pássaros, não veja o ministro, mas sim um membro da associação de criadores de periquitos? É concebível que um presidente de câmara que expresse a sua opinião sobre determinado assunto, possa despir o seu manto edílico e diga que fala como cidadão comum? Não! Serão sempre o ministro e o presidente de câmara. E, como tal, toda e qualquer opinião que manifestem terá o respetivo impacto de tal cargo na opinião pública. Por isso, não é sério enquanto membros de cargos de responsabilidade social, emitirmos apoios, opiniões e outras, sob a capa de "cidadão comum" ou com outras responsabilidades paralelas, como que a tentar tapar o sol com a peneira. A lei impede que um ministro seja proprietário ou gerente de uma empresa por conflito de interesses na área que tutela, mas, por outro lado, o bom-senso já não prevalece quando se oferece apoio publico a um qualquer candidato com a capa de ministro despida!
Que se separem águas de uma vez por todas para não andarmos sempre na ilusão, a sermos o patrão de manhã e empregado à tarde. Sejamos criaturas eretas e com caráter, que é um bem cada vez mais raro neste mundo. Se queremos assumir uma posição pública, façamo-lo com a áurea oficial que desempenhamos naquele momento e as responsabilidades que assumimos e não com um qualquer outro atributo "menor" apenas para não sermos acusados ou mal compreendidos. Ou então, como nos disse Oscar Wild, estejamos calados para não sermos mal interpretados, pois calados, na maioria das vezes, dizemos muito mais e o silêncio pairará neste mundo...
Professor Universitário
Bastonário da Ordem dos Enfermeiros (2012-2016)
