Passa-se uma esponja nos milhões do passado porque não há tostões de presente. E embrulha-se tudo nas prescrições para fugir às indemnizações.
O contribuinte, o cidadão comum, pode ter dificuldade em entender quanto valem os erros de gestão na Caixa Geral de Depósitos. Mas pressente tanto como sente quanto lhe custaram. Mesmo que se invoque que as operações de recapitalização não foram apenas decorrentes dos créditos indevidos, num contexto de recessão que fez colapsar todo o sistema financeiro. É verdade, também foi, mas não chega para minimizar a gravidade do que a auditoria da EY revela sobre anos de desmando. E que deixa perguntas sem resposta porque as respostas são perguntas.
Ao entregar a auditoria no Parlamento, o atual homem-forte da CGD, Paulo Macedo, manifestou-se contra o julgamento dos seus antecessores na praça pública. E considerou inaceitável que qualquer pessoa que tenha passado pela Caixa seja agora apontada como culpada e com "cadastro". A questão é precisamente a inversa. Até agora, não houve qualquer responsabilização pelo que se passou. No dia em que se apurarem culpados, a separação do trigo do joio fica feita. Mas até lá, depois do tanto que a CGD custou aos contribuintes, não nos peçam para sermos complacentes e pacientes. Ainda mais do que temos sido.
Já passou o tempo de nos pedirem para termos cuidado a falar do banco público, invocando um interesse nacional na sua estabilidade. A Caixa está hoje estabilizada e os portugueses têm direito a saber o que se passou. Quem decidiu o quê? Com que grau de conhecimento dos sucessivos governos? E têm direito a que haja responsabilização civil e recuperação de todos os cêntimos que (ainda) seja possível recuperar. E têm, mais ainda, direito a que haja apuramento de responsabilidades criminais. Sem isso, ficará a habitual sensação de impunidade que nos faz confiar cada vez menos em quem zela pela coisa pública.
A Caixa já foi um problema político. Hoje é um problema dos políticos. É um caso de Polícia. Para lá do ruído, do jogo do empurra, do faz de conta que o Parlamento não é juiz em causa própria, é preciso que o Ministério Público faça o seu trabalho.
Aguardaremos pacientemente pelos resultados. Muito pacientemente.
* Diretor
