O Poder Local, uma das maiores, senão a maior, conquistas de Abril, padece dos mesmos riscos que hoje percorrem as democracias ocidentais: a dificuldade, ou impotência, em resolver os problemas reais das pessoas.
A proximidade aos eleitores é, por isso, fundamental.
Só há oito países da UE28 (ainda inclui o Reino Unido) que não têm regiões administrativas, ou outros níveis intermédios de organização, entre o Estado e as autarquias, com líderes eleitos por sufrágio direto e universal. Temos bons amigos por companhia: Bulgária (provavelmente o mais pobre da UE), Estónia, Letónia, Lituânia, Chipre, Luxemburgo, Malta e Eslovénia (todos bastante mais pequenos que Portugal, alguns diminutos). Até a Hungria de Órban é menos centralista que nós (embora não tenha regiões, tem uma série de níveis intermédios de governação).
Poderíamos enumerar uma série de consequências de um país excessivamente centralizado (independentemente de se achar ou não que a regionalização, essa palavra maldita, é a melhor forma para atenuar as desigualdades territoriais). Desde o fosso nos rendimentos (em média mais 400 euros por mês em Lisboa do que no Norte), às pensões de velhice (em média mais 200 euros por mês em Lisboa do que no Centro), passando pelo número de diplomados do Ensino Superior (que mostram uma fuga evidente em direção à capital), ou pelo índice de envelhecimento (em que fica claro que só Lisboa atrai os mais novos e que é a região menos ameaçada pelo inverno demográfico).
Lisboa fica melhor em todos os índices quando comparada com as outras quatro regiões. Mas há um em que está claramente pior na fotografia: na taxa de cobertura das importações pelas exportações fica-se nos 46%, enquanto o Norte - tão mal colocado quando o que está em causa é o rendimento, envelhecimento ou pobreza - tem 131%.
Todos estes dados importam para a discussão que este domingo o JN abre no Rivoli, no Porto, com a conferência sobre "Os caminhos da descentralização", e que reúne autarcas de Norte a Sul.
As críticas substanciais que estão a gerar resistência em muitas dezenas de autarquias traduzem-se essencialmente no facto de receberem os problemas, mas não as decisões ou o envelope financeiro que permitem a sua resolução. E levam a que muitas não aceitem qualquer competência (Porto, por exemplo). E a que muito poucas tenham aceitado todas as áreas (Lisboa, por exemplo). Na maioria dos casos, aceitam apenas uma ou outra competência.
Há o outro lado também. O dos que entendem que, mal por mal, o melhor é absorver as competências e depois negociar os dinheiros. A história do pássaro na mão. Mas às vezes mais vale deixar os dois voar.
P.S. O PSD, um partido imprescindível no panorama político português, vai à segunda volta para escolher o líder. E há, desde logo, duas leituras imediatas. A primeira é a de que o projeto de Rio, com todas as dificuldades que tem atravessado, ainda convence os militantes, mas não para ser aclamado. As dúvidas em torno das quotas não ajudam. Mas, mais relevante, é o facto de os eleitores não verem uma verdadeira alternativa em Montenegro, que tem agora uma semana para dizer algo mais ao país do que uma guerra cerrada ao PS. Ou não convence. Ambos podiam começar por ser mais claros sobre o que querem para os territórios e as suas gentes. Mas o tema escalda.
*Diretor
