Na próxima terça-feira, o Facebook assinala 15 anos de existência. Neste tempo, alterou estilos de vida, transformou a comunicação e redimensionou fronteiras entre o espaço público e a esfera privada/íntima.
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Fez uma revolução, portanto. No ano passado, acumulou sucessivas polémicas. Mas também muito dinheiro. Mark Zuckerberg, o seu principal fundador, tem muitas razões para celebrar, mas também acumula motivos de extrema preocupação.
Quando em, 2004, Zuckerberg, Saverin, Moskovitz e Hughes, estudantes da Universidade de Harvard, lançaram uma rede destinada primeiro aos seus colegas, e, depois, alargada a outras faculdades, mal poderiam imaginar que aquela invenção rapidamente se transformaria na maior rede social à escala global. Hoje a empresa já conta com 1,523 mil milhões de utilizadores diários em todo o Mundo e 2,320 mil milhões de internautas ativos, em termos mensais. Estes números significam que cerca de um terço da humanidade se liga a esta rede social pelo menos uma vez por mês. Uma colossal adesão que confere à empresa imenso poder. E dinheiro, claro. No ano passado, o Facebook encerrou o seu exercício com um lucro de 22,112 mil milhões de dólares (19,2 mil milhões de euros), mais 39% do que no ano anterior. Este crescimento coincide com um tempo em que as polémicas também se foram acumulando.
Em 2018, a empresa foi confrontada com a fuga de dados pessoais dos respetivos utilizadores, com a acusação de ser um lugar pródigo na divulgação de "fake news" e com a constatação de que tinha falhas de segurança e uma enorme incapacidade para se autorregular. Neste tempo, pouco ou nada se fez para neutralizar estas (assertivas) acusações. De passagem por Munique, na Alemanha, para participar numa conferência sobre inovação, Sheryl Sandberg, número dois da Facebook, assegurou não serem hoje a mesma empresa, estando agora todos muito empenhados em vigiar a segurança dos utilizadores. No dia 8 de janeiro, Zuckerberg escrevia, na sua conta do Facebook, que este ano iria promover debates sobre o futuro destas tecnologias na sociedade. Boas intenções, portanto. Mas isso não chega. Há muita coisa que não foi ainda bem esclarecida. Por exemplo, o modo como os russos influenciaram a campanha eleitoral norte-americana ou a venda de dados pessoais à Cambridge Analytica...
Em paralelo a um modelo de negócio muito rentável, mas que levanta igualmente muitas questões legais e, sobretudo, éticas, os respetivos utilizadores vão rasgando caminhos em direção àquilo a que o sociólogo francês Michel Maffesoli chama "extimidade" (intimidade em público) com profundas consequências a nível pessoal e na vida coletiva. De forma quase sempre ingénua, muitas pessoas vão publicando fotografias de espaços privados/íntimos e partilhando estados de alma que devassam completamente a sua privacidade, nem sequer imaginando quem são aqueles que os observam através de múltiplos ecrãs ou que perceções os respetivos "amigos" vão construindo sobre si. É verdade que o Facebook revolucionou a comunicação, mas não alargou muito a rede dos verdadeiros amigos, nem tornou as organizações mais transparentes. Criou apenas a ilusão de um Mundo comum, partilhado por todos e uma ideia falsa de proximidade.
E aí estamos nós agarrados permanentemente à rede, acreditando que aí estão os nossos amigos, aí obtemos informação importante e aí alargamos infinitamente o nosso acervo de conhecimentos acerca de tudo. Há uma semana, na revista "Time", Roger McNamee, um investidor do Silicon Valley que foi mentor de Zuckerberg, lembrava que os utilizadores desta rede social vivem hoje dentro de uma bolha. Cá fora há um Mundo que não coincide com o universo do nosso Facebook.
* Prof. Associada com Agregação da U. Minho