Não bastava a criação dos pacotes, que tornam quase impossível ter um serviço de TV sem não sei quantas coisas associadas. Não bastava a multiplicação de tarifários e os esquemas para fidelizar os clientes - que a intervenção legal não resolveu. Nas empresas de telecomunicações devem trabalhar criativos que dão uma nova dimensão ao surrealismo e cuja função parece ser descobrir formas inovadoras de extorquir dinheiro aos clientes.
Claro que extorquir parece demasiado agressivo. Supostamente um cliente só compra serviços que quer. A não ser, por exemplo, quando lhe oferecem produtos adicionais que passam a ser pagos se não se lembrar de cancelar entretanto um serviço que não pediu. Há ainda a originalidade de ir a uma loja para pedir um cancelamento, mas este ter de ser feito por contacto telefónico. E para falar telefonicamente com um assistente? Parece uma gincana, dada a quantidade de passos. Teclas para escolher o tema, depois a subárea, coloque o NIF, e se conseguir não se enganar talvez com paciência acabe atendido.
Não admira que as telecomunicações motivem uma grande fatia de queixas junto de diferentes instituições. Na Deco, o setor liderou a insatisfação dos consumidores em 2016, com um total de 45 515 reclamações, a que se somam mais 6146 no Portal da Queixa. Junto da Anacom, a Autoridade Nacional de Comunicações, foram 69,5 mil as queixas apresentadas, mais 9% do que no ano anterior.
Os números não deixam de ser expressivos, mas não se pode esquecer que o universo de utilizadores é equivalente à população nacional. E parecem poucos para os desabafos e comentários que diariamente se ouvem sobre as operadoras. Todos conhecemos relatos de amigos que se queixam de demorar meses a resolver problemas simples como cancelar um serviço sem fidelização. E só o recurso ao provedor da Meo ajuda a ultrapassar obstáculos quase incompreensíveis. Estranhamente (ou não), é bastante difícil encontrar o contacto da Provedoria na página online desta operadora.
À Anacom exige-se um papel ativo e ao legislador um olhar cada vez mais apertado para os abusos das empresas. Mas nós, consumidores, também temos de exigir mais. E obrigar a uma fiscalização feroz que nos defenda efetivamente desta maré que, não apenas nas telecomunicações mas também na energia, atropela os clientes com tarifários complexos e carregados de ratoeiras. Sempre que se sentir lesado nos seus direitos, faça o favor de reclamar. Só assim poderemos ter de novo o comando.
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