Hoje é um dia em que são vários os temas que, pela apreensão que me causam, justificam o exercício desta escrita.
Pela vergonha que sinto por ver notícias sobre salários em atraso no Porto. Com a agravante de os autores deste crime (não tenhamos medo da palavra!) serem os membros da Junta da União de Freguesias erradamente designada do "Centro Histórico" e as vítimas serem os respetivos trabalhadores que prestam serviços fundamentais à população, designadamente a idosos e crianças. Junta cujo presidente, utilizando em cada dia um argumento (eu diria uma mentira) diferente para se justificar, acaba por se comportar como aqueles patrões que, nos anos 80, também consideravam que pagar atempadamente salários não era um dever, acaba por ameaçar fazer despedimentos - dando corpo à velha tese de inculcar medo às pessoas levando-as a pensar que mais vale ter emprego do que salários pagos a horas! Perante isto, Rui Moreira e o CDS de Assunção Cristas (que suportam este presidente de Junta), assobiam para o lado...
Pela revolta que sinto perante o assassinato de Marielle Franco, vereadora da Câmara Municipal do Rio de Janeiro. Esta mulher, originária de uma favela, que se distinguia pela defesa dos mais desfavorecidos e contra a violência policial e militar exercida contra os mais pobres, foi assassinada em plena via pública - sabendo-se hoje que com balas adquiridas por militares. Este assassinato mostra à evidência que o que se passa no Brasil é um processo, de que a destituição de Dilma, a nomeação de Temer, a reversão de direitos, a tentativa de impedimento da candidatura de Lula, a ocupação das ruas pela Polícia Militar e, agora, o assassinato de Marielle são várias peças. Que visam transformar, novamente, o Brasil numa república das bananas governada por oligarcas e terratenentes.
Pela constatação de que, infelizmente, o PS, em questões fundamentais, continua igual a si próprio e à sua prática "normal". Perante as propostas do PCP para alterar a legislação laboral, fazendo reverter as medidas mais gravosas tomadas por vários governos PSD/CDS, o PS aliou-se a estes partidos para chumbar estas iniciativas. Sendo pelo menos coerente com aquilo que fez (e Vieira da Silva era, na mesma, o ministro do Trabalho) aquando do Governo de Sócrates - que, recorde-se, levava o patrão da CIP, Pedro Ferraz da Costa (o mesmo que agora diz que os portugueses não querem trabalhar!...) a dizer que, em matéria laboral, os governos do PS eram melhores do que os da Direita. Deste modo o PS, que já antes tinha chumbado a reposição do valor das horas extraordinárias (cortadas pelo PSD/CDS), chumbou agora, entre outras medidas, o fim da caducidade dos contratos coletivos de trabalho. Contratos negociados coletivamente (o que dá mais força à parte mais "fraca" - ou seja os trabalhadores), o que levou diversas associações patronais a protelar a negociação de novos contratos, impondo a caducidade - para, a partir daí, ficar com mãos livres para impor, a cada trabalhador, as suas próprias condições. O que mostra que, apesar das posições de esquerda de vários dos seus dirigentes da nova geração, o PS, se se apanha com maioria absoluta, vai voltar ao seu trilho da política da direita...
* ENGENHEIRO
