Muitos produtores admitem não entregar as uvas este ano e pensam arrancar as vinhas. Direção promete pagar uma parte das verbas em atraso nos próximos dias.
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A poucos dias de se iniciar mais uma campanha da vindima, vários viticultores associados da Adega Cooperativa de Valpaços (ACV) dizem ter esgotado a paciência com as promessas não cumpridas por parte da Direção daquela cooperativa, de pagamento de três campanhas que estão em atraso (2013, 2021 e 2023) e admitem não entregar as uvas na que está prestes a começar.
Numa carta aberta, 132 dos 600 associados descrevem um cenário “caótico” e acusam a atual Direção de ser a responsável por mais de 400 hectares de vinha que já terá sido arrancada nestes últimos nove anos.
O presidente da Direção, Pedro Vinagre, garante apenas que uma das campanhas em atraso será brevemente liquidada.
Alguns associados dizem estar fartos de esperar pelo dinheiro e pensam em não entregar as uvas naquela adega e muitos admitem nem sequer vindimar. “Estou a pensar seriamente nisso. Se já não pagaram as outras, ainda vou por lá mais uvas, nem pensar!”, afirma Fernando Coelho.
“Já não meto lá as uvas, prefiro deixar na vinha e ganho mais. Já me devem quase 10 mil quilos delas”, conta Carlos Fontoura. “As pessoas assim não podem viver, não podem trabalhar de graça. Vou esmagar algumas para meu gasto e o resto fica na vinha”, acrescenta este agricultor.
“Para a banca há dinheiro, mas para quem leva lá o produto para aquilo sobreviver, não há”, lamenta António Gonçalves.
Apelo à demissão
Numa referida carta, os 132 associados acusam a Direção de “gestão danosa”, lamentando a “falta de credibilidade” que o vinho da ACV passou a ter, patente na queda das vendas de 2023 comparativamente a 2022 “superior a 50 %, já que passou de 1,2 milhões de euros para 570 mil euros”, conforme consta nos relatórios de contas apresentados nas assembleias gerais”, afirma a missiva. A ACV “deixou de ser fonte de rendimento para os viticultores para ser uma fonte de despesa inútil e supérflua”.
A carta termina com um apelo à Direção para se demitir.
Presidente diz que é “normal”
Confrontado com estas críticas, o presidente da Direção da ACV admite dificuldades que diz serem “transversais no setor do vinho em todas as regiões”, garantindo, por agora, que vai pagar uma das campanhas em falta. “A contabilidade e o banco estão a tratar do processo, porque é moroso, é preciso perceber os créditos que os sócios têm. Acredito que dentro de uma semana está uma campanha liquidada”, afirma Pedro Vinagre.
O responsável diz que “infelizmente esta situação é o normal das cooperativas”. “Era bom descarregarmos os tratores das uvas - e eu faço parte dos maiores associados - e levar o dinheiro para casa, mas não é assim”, diz.
Quanto à campanha de 2021, não adianta o prazo para pagamento. “Foi o ano onde houve excesso de vinho em todo lado. Hoje temos aproximadamente um milhão e meio de litros dos anos anteriores, que já não deviam estar cá, mas vamos ver o que podemos fazer”.
Apesar de admitir dificuldades nos últimos anos, que liga à pandemia, Pedro Vinagre desmente que tenha havido uma quebra nas vendas. “No último relatório de contas pode-se ver um aumento dos vinhos engarrafados nas vendas gerais da adega, um acréscimo de 50% em 2023 face ao ano anterior, mas 2022 e 2021 foram anos complicados”.
Pormenores
Pedro Vinagre
“Não sei quando vamos pagar a campanha de 2021. Foi o ano onde houve excesso de vinho porque somos obrigados a receber as uvas todas. Hoje temos um milhão e meio de litros dos anos anteriores, que não deviam estar cá.”
Carta de vinhos
A Adega Cooperativa de Valpaços produz vinhos tintos, brancos, rosés e espumantes das marcas DOC Ponte do Arquinho, Casa do Arco, Encostas do Rabaçal, Dolmen, Terra Quente e São Pedrinho.