A Câmara Municipal de Alcácer do Sal deu parecer desfavorável à mina da Lagoa Salgada, após análise no âmbito do processo de Avaliação de Impacte Ambiental. No início do mês, Grândola tinha chumbado também o projeto de prospeção de ouro e outros minerais, igualmente condenado por associações ambientais e agrícolas.
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As “preocupações com os recursos hídricos, nomeadamente a manutenção da qualidade e quantidade da água atualmente disponível na área envolvente face aos impactes do futuro projeto e dos efeitos esperados das alterações climáticas” levaram a Câmara de Alcácer do Sal a emitir um parecer negativo ao projeto de exploração mineira da Lagoa Salgada. O parecer ocorre após análise no âmbito do Processo de Avaliação de Impacte Ambiental (AIA) e foi emitido no âmbito da Consulta Pública, que terminou no passado dia 30 de abril.
A autarquia de Alcácer do Sal considera que “não se deve contabilizar apenas os efeitos económicos” do projeto, “pois estes só poderão ser considerados positivos se forem benéficos para toda a comunidade local”. No parecer, dado a conhecer ao executivo ontem, a autarquia diz que “o projeto não poderá colocar em causa o abastecimento de água para consumo humano, assim como a saúde humana dos vários aglomerados urbanos existentes na envolvente”.
O projeto da Redcorp – Empreendimentos Mineiros pretende explorar minérios (cobre, chumbo, zinco, prata e ouro, entre outros) num espaço de sete mil hectares que abrange a Freguesia de Torrão (Alcácer do Sal) e a União de Freguesias de Grândola e Santa Margarida da Serra e já tinha tido um parecer desfavorável da autarquia em 2020. Um ano antes, a exploração havia sido chumbada pela Agência Portuguesa do Ambiente (APA).
Uso de substância altamente tóxica
O parecer negativo de Alcácer do Sal segue-se a idêntica recomendação da Assembleia Municipal (AM) do concelho vizinho de Grândola. No início de maio, aquele órgão deliberativo manifestou “total oposição” ao projeto de exploração mineira da Lagoa Salgada, no âmbito da consulta pública da Avaliação de Impacto Ambiental.
“Do conhecimento vago que dispúnhamos sobre o projeto de investimento, fruto da realização de sessões públicas organizadas pela empresa e da consulta dos documentos disponibilizados no âmbito da Consulta Pública, as dúvidas anteriores tornaram-se certezas quanto aos prejuízos para esta comunidade”, lê-se na tomada de posição da AM de Grândola. Considerando a “natural oposição” ao projeto, em linha com posições anteriores tomadas, aquele órgão destacou os “riscos graves para os aquíferos usados no abastecimento público e atividades locais” como uma das várias razões para o parecer negativo.
A preocupação com os recursos hídricos foi também expressa por associações ambientalistas e de agricultores, alertando que “o promotor prevê a utilização de cianeto de sódio no processamento do ouro, justificando que as alternativas no mercado inviabilizam o projeto do ponto de vista técnico e económico”. Trata-se de “uma substância altamente tóxica, com riscos amplamente reconhecidos”, segundo a posição assumida na consulta pública pela associação ZERO e subscrita em conjunto com a Associação de Agricultores de Grândola, FAPAS, GEOTA, Proteger Grândola e SPEA.
Mina em zona de reserva estratégica de água
“Em segundo lugar, preocupa a presença de áreas com rochas potencialmente geradoras de escorrências ácidas, o que representa um risco adicional de contaminação dos recursos hídricos, tanto na fase de exploração, como após o encerramento”, dizem as associações. O comunicado lembra que a Mina da Lagoa Salgada “está inserida na Região Hidrográfica do Sado e Mira (RH6) que, sendo uma reserva estratégica essencial ao abastecimento público, enfrenta já situações críticas relacionadas com a escassez de água e a sobre-exploração dos recursos hídricos subterrâneos” e consideram insuficiente a informação apresentada pelo promotor sobre o circuito de consumo de água do projeto.
“Este é um projeto com tempo de vida útil expectável de apenas 11 anos, com impactos ambientais, sociais gravosos, e que, incompreensivelmente, obteve o estatuto de Potencial Interesse Nacional (PIN), em 29 de abril de 2022”, lamentam as associações. “Trata-se de mais um exemplo de como a atribuição de estatuto PIN pode ser usada de forma discricionária para contornar restrições legais e facilitar a aprovação de um projeto privado, cuja utilidade pública é, no mínimo, muito discutível”, acrescentam.
Argumentação que teve eco em Grândola, cuja AM, além de reiterar a oposição ao projeto, anunciou que irá “propor ao próximo Governo que retire a classificação de PIN a este projeto” e sugeriu que o município “estude a possibilidade de impugnação nos tribunais” da Mina da Lagoa Salgada.
Aquele órgão deliberativo recomendou ainda à Câmara Municipal de Grândola que “avance com as medidas para impedir a utilização da estrada municipal como a acessibilidade para o escoamento do minério”, que é outras das preocupações expressas no EIA, e afirmou que pretende trabalhar com os restantes órgãos municipais e regionais, com o movimento associativo e com a população do concelho “na luta contra o desenvolvimento deste projeto prejudicial para o concelho.”
Câmara de Grândola diz que projeto ameaça saúde pública
Antes da deliberação da AM, já a Câmara de Grândola havia emitido também parecer desfavorável ao projeto da Mina da Lagoa Salgada, considerando que “apresenta evidentes e significativos efeitos negativos para a população, território, paisagem e ambiente - comprometendo o desenvolvimento sustentável do concelho.”
O executivo de Grândola emitiu parecer desfavorável ao projeto da Mina da Lagoa Salgada no dia em que terminou a consulta pública, a 30 de abril. “Após análise cuidada, a Câmara considera que o projeto viola o Plano Diretor Municipal, ao ignorar zonas protegidas pela Estrutura Ecológica Municipal, ameaça recursos hídricos, coloca em causa a saúde pública, devido a poeiras, ruído e vibrações de explosões subterrâneas, destrói a biodiversidade e coloca em causa a qualidade de vida da população – principalmente a que reside nos aglomerados rurais de proximidade - cujo desenvolvimento fica, também, seriamente comprometido”, informou a autarquia.