O aumento da temperatura e a diminuição geral dos níveis de precipitação, mas com ocorrência de fenómenos extremos de chuvas torrenciais num curto espaço de tempo, já são uma realidade e sinónimo de inquietação para investigadores e operacionais da área da Proteção Civil, na região do Alto Minho.
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O cenário de alerta foi traçado, esta segunda-feira, numa conferência sobre Proteção Civil em Caminha, pelo investigador Joaquim Mamede Alonso, coordenador técnico-científico do Plano Intermunicipal para as Alterações Climáticas, desenvolvido pela Comunidade Intermunicipal (CIM) do Alto Minho, e docente do Instituto Politécnico de Viana do Castelo (IPVC).
O especialista indicou que o quadro de mudança climática “é efetivamente premente” e trará consequências como o “aumento do risco de incêndio”, a possibilidade de algumas zonas do interior do Alto Minho passarem “a ter problemas de falta de água” e até a “extrema” dificuldade de operação dos parques eólicos existentes na região.
“As noites tropicais vão continuar a aumentar”, afirmou o especialista em energia e ambiente, que no início da sua intervenção confessou: “Tenho acompanhado os trabalhos do painel internacional para as alterações climáticas, enquanto um dos revisores do último relatório, e se até há pouco tempo estava preocupado, quando trabalho no plano intermunicipal e planos municipais, já não diria preocupado, fico efectivamente…não sei se o termo assustado será o melhor”.
Na conferência de Caminha, onde também foi abordado o tema da comunicação em situações de emergência, Mamede Alonso apresentou dados que indicam que a temperatura “vai continuar aquecer e a aquecer de forma desigual no território, particularmente nas zonas de interior e vales”. O que se refletirá “na vegetação que quando chegar ao verão estará muito seca”, e terá implicações nos “sistemas produtivos, como o dos vinhos, horticulturas, florestais e até nas pastagens”.
Caso da precipitação é “o oposto”
“Vai chover mais em menos tempo”, disse, explicando que “mais do que tendência a diminuição”, se verifica “concentração da precipitação durante alguns períodos ou fenómenos extremos”, que interferem “em toda a hidrologia regional”.
“Vão ver que, se calhar, algumas regiões do Alto Minho (...) vão ter problemas de falta de água e de abastecimento, o que é em si exemplificativo dos desafios que temos”, descreveu o investigador, acrescentando que estudos sobre a “velocidade, direção e tendência do regime de ventos” revelam também que “até os parques eólicos vão ter cada vez mais dificuldade de operação, seja no mar ou em terra, embora continuemos a ter um elevado potencial eólico”.
Juan Picos, coordenador do projeto FirePoctep+ (2024-2026), que visa o reforço dos sistemas de prevenção e extinção de incêndios florestais na região transfronteiriça de Portugal e Espanha, chamou a atenção para os “fenómenos extremos”, em termos de incêndios “aos quais não estávamos habituados” naquela região. “Estamos num momento que é um choque entre dois comboios. Incremento de energia acumulada no território (biomassa) e de energia atmosférica. (…) Quando estas duas energias se conectam acontecem fenómenos extremos”, alertou.
“Temos de comunicar bem e informação útil”
"Comunicação eficaz em situações de crise: boas práticas e desafios”, foi outro tema abordado na conferência de Caminha.
O diretor-adjunto do JN e especialista em ciberjornalismo e redes sociais, Manuel Molinos, exortou as autoridades de Proteção Civil a facilitar informação aos orgãos de comunicação sobre as ocorrências no terreno, principalmente numa vertente de “utilidade” para os leitores, que hoje em dia consomem notícias principalmente pelo que lhes chega pelo telemóvel.
Indicou que “informação sobre o tempo é a mais procurada pelo público”, porque “ajuda a tomar decisões no dia-a-dia”.
“Temos de comunicar bem e a informação tem de ser útil”, afirmou, considerando que, por exemplo, no caso de um acidente ou incêndio que implique condicionalismos de trânsito, é necessário “ser rápido para influenciar as tomadas de decisão dos utilizadores”.
Emanuel Oliveira, do Laboratório Rural de Paredes de Coura, apresentou uma investigação sobre o fogo no Alto Minho (2001/2020), que revela que aquela região “é das regiões da Europa com mais ‘piroatividade' nos últimos 20 anos”.
“Muita da área ardida é ignorada”, declarou, indicando que os dados de incêndios anunciados oficialmente deixam de fora “fogos que se auto-extinguem ou em que não foram usados meios oficiais de extinção”, nomeadamente em zonas queimadas para efeitos de caça, pastoreio e apicultura.
Vitor Azevedo, do Serviço Municipal de Proteção Civil de Braga, que falou sobre a importância do ordenamento do território e processos de edificação na prevenção de riscos, destacou também a necessidade de “mais apoios” do Governo e legislação adequada à implementação de medidas no terreno por parte dos municípios.
Fernando Zamith, docente da UP, falou sobre “o clickbait no ciberjornalismo” e para a necessidade de combater a “iliteracia mediática”.
“O jornalismo profissional não dá tanto clickbait”, disse, defendendo que este “não se pode contaminar” com a prática do “sensacionalismo”, e “ao mesmo tempo a sociedade tem de discernir o que não é jornalismo”.