População de Pomares, em Melgaço, não abdica da devoção e festa a Santiago, em julho.
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No lugar de Pomares, em Paderne, Melgaço, não se fala noutra coisa: o pároco suspendeu o culto na capela de Santiago por causa de uma grade de proteção que paroquianos colocaram no adro "à sua revelia". A população, na sua maioria ex-emigrantes, está revoltada e com o aproximar da festa do padroeiro, a 25 de julho, uma das maiores do concelho, prepara-se para a cumprir "à civil".
A Comissão de Festas é composta por dois ex-emigrantes e três emigrantes em França. Sagrada para a emigração de Pomares espalhada pelo Mundo e pelos que já regressaram à terra, a capela tem sido alvo de obras pagas e, por vezes, executadas pelos próprios. E, por isso, ninguém parece estar disposto a ceder às condições impostas pela Igreja para retomar o culto (ler caixa).
"Se a capela não estiver aberta para a festa, arromba-se a porta. A freguesia está toda revoltada e isto já chegou a França", brada Inês Rodrigues, mulher de Eduardo Pestana, dono do café O Madeirense, e mordomo das festividades. O marido mantém-se sereno, enquanto a mulher pragueja contra o padre. Garante: "Vai haver festa. Os contratos estão todos fechados. O fogo de artificio, os altifalantes, os arcos, as flores, as licenças, os conjuntos musicais, os andores, está tudo pronto". E acrescenta que o gasto de "cerca de 33 mil euros" está assegurado por emigrantes e ofertas de peditórios. A mulher não desarma: "Haver festa há. Se ele [o padre] quiser que seja por bem, será por bem. Se for por mal, o problema será dele".
Devoção no número 757
Abel e Maria Olinda Lourenço, ex-emigrantes em França, moram no número 757 da estrada de Santiago, a escassos metros da capela do santo em Pomares. A casa está pejada de imagens do padroeiro. O casal já fez o caminho de Santiago, por devoção, duas vezes e Abel até esculpiu o santo em pedra e pô-lo na varanda.
"Ajudou-nos sempre muito por esse mundo fora. Sozinhos, a dois mil quilómetros da terra, não é fácil. Tínhamos de nos apegar a alguma coisa. As viagens eram duras. Nunca nos aleijámos", justifica. Em 2007, acredita, Santiago concedeu-lhe a "graça" de escapar a um cancro da mama. "Nos homens, dá a um em cada 200. Tocou-me a mim", diz Abel Lourenço, indicando a falha que se adivinha no tórax por baixo da camisa. "Tiraram-me o peito e ainda fui operado segunda vez para extraírem na axila", conta.
Este ano, a doença bateu à porta da mulher. Maria Olinda anda em tratamentos no IPO do Porto. "A gente tem de ter fé", desabafa o marido, referindo que, independentemente da polémica com o pároco, "o Dia de Santiago vai ser respeitado". "Queremos a capela por nossa conta. Fomos nós que a fizemos, não foram os padres", conclui.
Pároco quer que povo manifeste "arrependimento"
No boletim informativo "O Vinhateiro", os párocos de Divino Salvador de Paderne, Raul Fernandes e César Maciel (responsável pelo culto em Pomares), publicaram um comunicado sobre "a colocação de uma grade de proteção ao adro da capela no dia 2 de abril". "Face ao sucedido, consideramos a capela suspensa de culto até que se apresente quem mandou executar tal trabalho e esclareça com que dinheiro. E os vizinhos manifestem arrependimento pelo sucedido e queiram acatar as normas da igreja diocesana, e respeito pelos párocos e pela sua missão pastoral e administrativa", anunciam. Contactado pelo "Jornal de Notícias", o padre César Maciel, não quis prestar declarações.
Saiba mais
Pinta o bago
A tradição da festa de Santiago de Pomares dita que se "lave o santo com vinho". O ritual é inspirado no dito popular "Santiago pinta o bago". Na capela há duas imagens, a mais antiga, desgastada pelas lavagens, e uma nova.
Peregrinos
A capela de Santiago de Pomares data do século XVIII e situa-se, muito provavelmente, no Caminho de Santiago, vindo de Castro Laboreiro, Lamas de Mouro e passando por Cubalhão, dirigindo-se para Estivadas, Paderne, onde no convento existia uma albergaria para acolhimento dos peregrinos.