A associação ambientalista Amigos do Cáster e a organização não-governamental de conservação da natureza Quercus querem parar o abate de pinhal a decorrer em Ovar, defendendo a discussão pública do assunto e uma análise às respetivas receitas.
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Em causa está o abate de quase 250 hectares de árvores até 2026 no Perímetro Florestal das Dunas de Ovar, que, com os seus 2.159 hectares, é a maior mancha verde contínua nesse município do distrito de Aveiro, liga três sítios da Rede Natura 2000 e inclui entre os seus principais proprietários a câmara municipal e as juntas das freguesia costeiras -- entidades essas para as quais reverte a receita total de resinagem nos pinhais e 60% do lucro com as madeiras cortadas, cabendo os restantes 40% ao Instituto Nacional de Conservação da Natureza (ICNF).
O Plano de Gestão Florestal para essa extensão de pinhal já foi anunciado em 2016, mas só em meados de janeiro de 2022, perante a transformação drástica da paisagem de Cortegaça, é que o procedimento gerou alarme na população, motivando inclusivamente uma petição que em poucos dias reuniu mais de 17 mil assinaturas contra o abate cego de pinheiro-bravo.
É nesse contexto que a associação juvenil Amigos do Cáster vem agora argumentar em documento público: "É incompreensível que não estejam a ser aplicadas medidas de conservação e gestão essenciais para a manutenção desta importante área florestal do concelho".
Realçando que "a crescente contestação social parte de um legítimo crescimento da consciência ambiental e cívica", esses ambientalistas afirmam, aliás, que "a ausência de diálogo e esclarecimentos cabais, e a omissão ou delegação de responsabilidades, por parte dos organismos públicos, tem contribuído grandemente para a crescente polémica e contestação".
A estrutura defende, por isso, "a realização de um processo de discussão pública participado, em que sejam esclarecidas e discutidas, com seriedade e serenidade, questões relativas às boas práticas de gestão e conservação da floresta [local], à sua governança e à sua sustentabilidade ecológica, social, económica e financeira".
Para os Amigos do Cáster, outro aspeto contribui para que essa análise seja "urgente e necessária": além das receitas afetas a madeira e resina, "a recente alienação de 20 hectares do Perímetro Florestal das Dunas de Ovar por parte da Câmara Municipal de Ovar gerará um encaixe financeiro de aproximadamente 1,5 milhões de euros".
Por sua vez, essas verbas assumem "particular relevância num contexto em que, de acordo com o Plano Regional de Ordenamento Florestal do Centro Litoral, o Perímetro Florestal das Dunas de Ovar é uma área de baixa prioridade para subvenções públicas -- que são insuficientes e tardam -- e o município de Ovar está fora de grande parte do financiamento disponível ao abrigo do Plano de Recuperação e Resiliência".
Já o núcleo de Aveiro da Quercus apela "à suspensão e reversão da decisão do corte raso do pinhal-bravo nos talhões do Perímetro Florestal das Dunas de Ovar", porque a intensidade da intervenção, numa zona apontada como "sensível", gera não apenas apreensão social, mas também científica.
"Com os cenários das alterações climáticas, não se compreende que se pretenda abater 250 hectares de pinheiro-bravo numa floresta litoral, bem como se estranha o anúncio de que a reflorestação de uma zona invadida pelas acácias será espontânea, sem intervenção humana", diz essa organização em comunicado.
Manifestando-se "solidária" com os subscritores da petição "Salvem o Perímetro Florestal das Dunas de Ovar", a Quercus aponta depois a câmara municipal como a entidade que, de todas as envolvidas, melhor pode "deliberar a suspensão [do abate] para reversão da decisão do corte raso" entre Esmoriz e Torrão do Lameiro.
"Considerando também o grave problema do recuo da linha de costa no concelho de Ovar, a manutenção da floresta de proteção no litoral é importante para contenção da erosão costeira, pelo que deve ser avaliada a suspensão e alteração dos cortes previstos no Plano de Gestão Florestal [do ICNF]", conclui.