
Alunos do Conservatório de Braga conheceram Isabel João Silva
Adelino Meireles
O projeto Native Scientists quer que Portugal seja o primeiro país onde todas as crianças de 10 anos já conheceram um cientista da sua terra natal.
Corpo do artigo
Há um semicírculo de mesas preenchido por 20 pequenos “cientistas” de Braga que envergam batas brancas à sua medida. É-lhes perguntado como é o aspeto de um cientista. Uma aluna apressa-se a apontar para a imagem no fundo da sala. Está ilustrado o físico teórico mais conhecido do mundo, Albert Einstein. Mas, à frente dos alunos, está uma pessoa que faz ciência bem diferente daquela dos cabelos desgrenhados.
É uma mulher, chama-se Isabel João Silva e enverga umas calças de ganga e uma camisola que não chamaria a atenção de nenhum dos alunos. Estudou na mesma escola onde agora se apresenta, o Conservatório de Música Calouste Gulbenkian de Braga, e vem mostrar que os cientistas não são todos o Einstein.
A visita acontece pela Native Scientists, uma organização pan-europeia sem fins lucrativos que liga crianças e cientistas. Em Portugal, fá-lo desde 2021 através do programa Cientista regressa à escola. Leva cientistas de volta às suas antigas escolas primárias, desafiando-os a falar sobre si, o seu percurso e o seu trabalho científico a crianças do 4.º ano de escolaridade.
Idade crítica
A escolha da idade na qual o projeto incide é fundamentada: “Há um declínio de interesse em ciência entre os 10 e os 14 anos”, diz-nos Beatriz Amado, um dos rostos da Native Scientists. O objetivo do programa é conseguir que Portugal seja o primeiro país onde todas as crianças que passam para o 5.º ano de escolaridade já conheceram um cientista da sua terra natal. Nesta edição, irão alcançar esse objetivo em vários concelhos e terão atividades em todos os distritos, menos Setúbal.
O objetivo tangível é justificado por um outro: a crença de que o despertar da curiosidade científica em tenra idade combate as desigualdades no acesso ao conhecimento. É por isso que, apesar de também trabalharem em escolas como esta, o foco do projeto assenta na cooperação com aquelas que se inserem em Território Educativo de Intervenção Prioritária (TEIP). “O impacte do que fazemos é maior em áreas com baixa densidade populacional, grande número de jovens em risco de vulnerabilidade social ou elevada taxa de reprovações”, explica Beatriz Amado.
A premissa é mostrar aos mais pequenos, especialmente àqueles em fragilidade social ou económica (à partida, é menos provável que prossigam estudos numa área científica), que qualquer um pode ser cientista. E que tudo é ciência, como começou Amado por fazer ver. “Quem quer ser futebolista?”, perguntou, seguindo-se quase metade dos braços no ar. “Também para ser futebolista é preciso ciência ou acham que o Ronaldo ou o Messi conseguem aqueles resultados sem estudar?”
Quando começou, o programa tinha uma rede de 15 cientistas. Hoje, são cerca de cem os profissionais que, em voluntariado, voltam a pisar os corredores e as salas nas quais estudaram, duas sessões em cada ano letivo, para falar aos futuros cientistas.
Trabalho além-fronteiras
Apesar de criado e alavancado por uma equipa maioritariamente portuguesa, a Native Scientists tem uma abrangência europeia.
A organização foi criada em 2013 e o programa “Mesma comunidade migrante” foi o primeiro projeto, que ainda hoje realiza oficinas científicas em várias cidades europeias, juntando crianças migrantes e cientistas que falam a mesma língua de herança. O objetivo, além do já referido com o projeto nacional, é “ampliar os horizontes das crianças, promover a alfabetização científica e o ensino superior e promover o desenvolvimento da linguagem”.

