Município de Estarreja apoia moradores carenciados há duas décadas, concedendo ajuda até sete mil euros.
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Alexandre Moutela, 70 anos, assoma à porta da casa onde mora há cerca de 50 anos, num dos extremos da cidade de Estarreja. Agora está tranquilo, mas viveu anos com medo que o telhado desabasse sobre ele, a mulher e os animais de estimação que lhes fazem companhia. Em Avanca, Filipa Monteiro, 47 anos, abre um sorriso quando fala da importância das obras de isolamento na habitação, que deverão arrancar em breve. No próximo inverno, a moradora espera não ter de andar com cobertores às costas e sentir a saúde dela e do filho a deteriorar-se.
Estas são duas das famílias apoiadas pelo programa municipal Casa Melhor, através do qual a Câmara de Estarreja suporta despesas até sete mil euros em habitações próprias degradadas de residentes sem recursos, para lhes dar mais conforto e dignidade. A uma e a outra, as intervenções nas casas têm reflexos mais profundos: devolveram-lhes tranquilidade e esperança.
“Isto provoca uma instabilidade emocional, uma insegurança, um medo, que só quem está debaixo é que percebe a situação”. O desabafo de Alexandre sai numa voz trémula. Viveu “quatro ou cinco anos” com medo de que o telhado colapsasse e só há poucos meses, quando os trabalhos ficaram concluídos, voltou a dormir mais descansado. Sem ajuda, era “impossível” fazer obras, assume o idoso, explicando que os trabalhos, recentemente concluídos, estiveram para ser executados há dois anos, mas a desistência do empreiteiro fez com que o processo voltasse à “estaca zero”, prolongando o sentimento de insegurança da família.
“O problema fulcral era o telhado, que apresentava uma concavidade enorme, em risco de colapso”, conta. A situação foi corrigida e foi feito isolamento das placas, porque “chovia” na cozinha e na casa de banho. A habitação tem outros problemas, porém. As “janelas e portas ainda são de origem”. Faltam vidros em muitas e os caixilhos em madeira estão deteriorados. Os tetos, acrescenta Alexandre, “também estão em risco”, mas não representam um “perigo tão grande como o do telhado, que podia desabar”. Para estes problemas, a família conseguiu ver aprovada uma candidatura e receberá fundos do Plano de Recuperação e Resiliência, que, “à partida”, permitirão realizar o resto das obras necessárias para viver com conforto nos próximos anos.
“Grande alegria”
Filipa Monteiro mudou de Vila Nova de Gaia para Avanca, no concelho de Estarreja, há poucos anos. Sofre de lúpus e tem “problemas nos ossos”. Ao filho foi diagnosticado autismo. Divorciou-se. A empresa onde trabalhava pelo ordenado mínimo abriu insolvência em maio, atirando-a para o desemprego.
Mas vestiu-se como se de um dia de festa se tratasse para receber o JN. Porque as obras de que quer falar são “uma grande felicidade”. De inverno, “mesmo que ligue a lareira, não dá, a casa é gelada. Aquecedores só usamos em dias muito difíceis, pois fica caro. Andámos com uns cobertores nas costas e é assim que temos sobrevivido”, relata. Foi por isso que pediu “ajuda à Câmara para colocar capoto”, uma melhoria que não conseguiria fazer sozinha, mas da qual necessita para “poder viver com mais qualidade”. As obras ainda não começaram, mas no próximo inverno conta ter o problema resolvido.
Todos os anos, chegam pedidos à autarquia. Desde que o programa Casa Melhor arrancou, há duas décadas, o investimento municipal para travar a deterioração de habitações de munícipes carenciados de Estarreja já ajudou mais de três centenas de famílias e superou um milhão de euros. Na edição do ano passado, contemplou nove famílias, totalizando um apoio financeiro de 63 mil euros. Este ano, já foram apresentadas 16 candidaturas.
Através das obras, que neste momento têm um teto máximo de sete mil euros, o Casa Melhor tem permitido que muitas famílias se possam manter nas próprias casas, com “condições mínimas de dignidade”, explica a vereadora Isabel Pinto. Têm sido resolvidos, sobretudo, problemas de telhados, humidade, isolamento deficiente, instalações elétricas e de água, acessibilidade e até construção de instalações sanitárias.
“Algumas destas situações, a evoluir, poderiam fazer com que as habitações deixassem de estar habitáveis, porque o telhado poderia ruir ou as infiltrações poderiam colocar em causa a saúde de crianças”, reforça a autarca ao JN, convicta de que algumas das situações eram de tal forma gravosas, que as famílias poderiam ser forçadas a deixar as suas casas e engrossar as listas de espera de habitação social no concelho, que tem atualmente 63 agregados com carências financeiras.