A Rua da Atalaia, em Lisboa, na madrugada desta quarta-feira transformou-se numa autêntica discoteca ao ar livre. Sem máscara e de copo na mão, centenas de jovens dançavam ao ritmo da música que vinha dos vários bares, abertos até às 2 horas desde domingo.
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Artur Paulo, 23 anos, espera à porta do bar La Bamba, na Rua da Atalaia, para conseguir comprar uma bebida. No meio de centenas de jovens - que se debatem ora para entrarem num bar, ora por ganharem espaço para dançarem simulando uma pista de dança ao ar livre - Artur é dos poucos com máscara. E há uma explicação.
"Todos deveriam usar, mas eu tenho problemas pulmonares e faço parte do grupo de risco para apanhar covid-19. Estou aqui porque acho que temos de aprender a conviver com a doença, precisamos de sair até pela nossa saúde mental", desabafa o jovem que não vinha ao Bairro Alto há quase três anos. "Em casa fechados não podemos curtir. Já estava a ficar difícil", reconhece.
Dentro do La Bamba cumpria-se o limite de pessoas definido pela Direção Geral de Saúde, mas ninguém usava máscara. "Eles entram para beber, têm de tirar a máscara", observa João Palmo, funcionário à porta do bar, que ia deixando entrar mais jovens assim que outros abandonavam o espaço. As restrições no interior dos bares, cumpridas apenas por alguns, contrastavam com o que se via cá fora.
Centenas de jovens, principalmente estrangeiros e turistas, acumulavam-se à porta dos bares, sendo impossível dar um passo sem ser pisado ou convidado a entrar numa das várias rodas de amigos que se formavam para dançar, à semelhança de uma discoteca. A música vinda dos bares, principalmente na Rua da Atalaia, convidava aos ajuntamentos, mas, onde a música não chegava, cantava-se ou usavam-se colunas portáteis.
Os tradicionais "botellones" também voltaram, com vários a prepararem bebidas compradas antecipadamente em supermercados. Na rua, nem um sinal de polícia, ao contrário do que aconteceu quando os horários de fecho dos estabelecimentos noturnos eram mais reduzidos, até às 10.30 horas. Só pela 1.00 hora apareceram quatro viaturas da polícia a rondar o Bairro Alto, mas nenhum movimento de fiscalização ou dispersão.
"Tem sido a loucura, fiquei até às 4 horas"
Um cenário que se tem repetido nos últimos dias. Muitos jovens comentaram com o JN que, de férias ou desempregados, têm saído há várias noites consecutivas e não sentem a presença policial. Desde domingo, com o horário de fecho dos bares alargado até às 2 horas, "tem sido a loucura". "Segunda-feira fiquei até às 4 horas da manhã. Já tinha muitas saudades, sentimos muita vontade de liberdade, foram muitas restrições", admite Elaine Santos, 33 anos, brasileira a viver em Portugal há dois anos.
Sara Silvestre, 25 anos, juntamente com o grupo de amigos, procurava há mais de uma hora por uma mesa de esplanada livre, mas sem sucesso. "A vida voltou e tínhamos imensas saudades, mas não queríamos estar nesta confusão toda. Só queríamos estar no nosso espaço a conviver", conta a jovem que não saía para o Bairro Alto há mais de um ano.
Um sentimento partilhado por Esperança Custódia, 18 anos. "Tinha saudades de sair, mas tenho medo de estar no meio da confusão", partilhou, encostada a um prédio com uma amiga, longe dos ajuntamentos. Mateus Filipe, 25 anos, vivia um misto de emoções. "Adoro voltar à vida, mas, por outro lado, moro no Bairro Alto e ontem foi muito difícil dormir aqui. Está demais, até estou a pensar mudar de casa".
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Confiantes na vacinação
Na Rua do Diário de Notícias, na Rua do Norte ou na Rua da Barroca o convívio entre os jovens era mais regrado, com vários sentados em mesas de esplanadas afastados. Na Cervejaria do Bairro, um casal de namorados de São Francisco, Califórnia, de férias em Lisboa, ao início da noite elogiava as medidas em Portugal. "Dentro dos bares conseguimos estar afastados, nos Estados Unidos é impossível. Tememos, por outro lado, que Portugal fique igual, porque os jovens estão a voltar a sair em força", diz Tracey Kirwi, 27 anos.
A maior concentração de jovens foi mesmo na Rua da Atalaia, onde sobretudo franceses, italianos, espanhóis, chilenos, americanos, brasileiros, entre outras nacionalidades, fizeram a festa pela noite adentro. Danae Caetano, 24 anos, natural do Chile, veio trabalhar um ano para Portugal e já tinha saudades de sair. "Para nós o alívio das restrições é ótimo, somos jovens e assim temos muitas mais coisas para fazer".
Ambroise, 23 anos, francês de férias em Lisboa há dois dias, não estava tão preocupado com o risco de contágio uma vez que já foi vacinado. "Sinto-me tranquilo, tenho todos os cuidados. Em França os bares já estavam abertos, nem sabia que em Portugal só abriram agora". Portugueses partilhavam a mesma opinião. "60% da população europeia já está vacinada. Já tive covid-19 há um mês por isso já estou imune", acredita Diogo Gerós, 21 anos. O amigo, José Gostoso, sentia a mesma despreocupação.
"Éramos o único país da Europa com esta percentagem de pessoas vacinadas que não tínhamos bares abertos, não fazia sentido. Ajuda a retomar os negócios da restauração, mas também o nosso bem-estar mental, que é muito importante para o desenvolvimento saudável dos jovens".