Vítimas de violência doméstica e doentes com cancro estão entre os beneficiários do projeto de saúde oral desenvolvido em parceria com a Mundo a Sorrir.
Corpo do artigo
Angélica Paulo, bracarense com 64 anos, foi surpreendida por um cancro há seis anos que lhe roubou o sorriso, depois dos tratamentos lhe causarem a perda de dentes. Rosa Soares, com 66 anos, viu a sua vida "dar um tombo", após o divórcio. A separação livrou-a de um ambiente de violência doméstica, mas deixou-a, também, sem condições económicas "para continuar a tratar da boca". Recentemente, as sexagenárias ganharam um novo alento, graças ao projeto Braga a Sorrir, que, em quase oito anos, já tratou da saúde oral de 2944 pessoas carenciadas, gratuitamente.
Angélica Paulo não consegue conter as lágrimas com o resultado da prótese dentária que lhe devolveu o sorriso, depois de dois anos em que evitava festas e fotografias com os netos "por vergonha". "Eu não contactava com ninguém, tinha uma autoestima muito em baixo, porque já não tinha dentes nenhuns à frente", conta a bracarense, ao lado da filha, Patrícia Paulo, também beneficiária do projeto
"Eu tinha vários dentes cariados e não os tratava, porque estou no desemprego e o subsídio é muito pouco para aquilo que preciso. Um ou dois dentes já me doíam bastante", relata a jovem de 30 anos, desdobrando-se em elogios ao programa municipal que cuidou de si, mas também permitiu que a mãe ficasse "outra pessoa".
Rosa Soares diz que ganhou "uma família" no Braga a Sorrir, após o divórcio. "Fiquei doente com depressão, desorientada e senti-me desprezada pela própria família. Deixei de trabalhar e não tenho possibilidades de ir a um dentista com uma reforma de 400 euros", justifica a bracarense, agora já com a prótese dentária tratada e sem cáries.
Elsa Antunes, coordenadora do Braga a Sorrir, revela que, do total de beneficiários, "74% precisaram de reabilitação através de prótese e, destes, 70% precisaram de dupla prótese". "Estamos a falar de bocas destruídas. Há pessoas que apenas comem papas e têm carências nutricionais", lamenta a responsável, adiantando que, pelo gabinete médico instalado no Shopping Santa Tecla, passam, por exemplo, pessoas sem-abrigo, vítimas de violência doméstica, ex-toxicodependentes e pessoas em reabilitação por consumos vários. "Temos população jovem, com 20 e poucos anos, com pouquíssimos dentes. Mas também é normal recebermos famílias inteiras", frisa a socióloga.
500 euros por prótese
Desde que abriu, em abril de 2015, os dentistas do Braga a Sorrir já contabilizaram 41 389 consultas e realizaram 73 976 tratamentos. Também já foram doadas 5298 escovas e pastas dentífricas.
"Uma prótese pode custar mais de 500 euros. É algo a que não conseguiriam aceder noutro lado", atesta Mariana Dolores, presidente da Mundo a Sorrir, organização não governamental que desenvolve o projeto, em parceria com o Município de Braga.
"O que queremos é potenciar a empregabilidade, melhorar a qualidade de vida e a autoestima dos pacientes", resume a dirigente, recordando pessoas que "mesmo com um trabalho têm, às vezes, três euros por dia para viver".