Templo em Rates, na Póvoa de Varzim, tem 900 anos e é monumento nacional, mas está a degradar-se sem obras. Câmara, Junta e paróquia desesperam com situação "calamitosa".
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Há musgo a cobrir as paredes interiores, arbustos no telhado, vitrais partidos, o pórtico principal está a desaparecer, o quadro elétrico é um "perigo iminente". São quase 900 anos de história, um monumento nacional classificado e o mais importante exemplo do românico condal português a gritar por socorro. Está assim a Igreja de S. Pedro de Rates, na Póvoa de Varzim.
Câmara, Junta e Paróquia já bateram "a todas as portas". Há quatro anos, a Direção Regional da Cultura do Norte (DRCN) fez o levantamento dos estragos. Questionada agora pelo JN, afirma conhecer o caso, mas garante que a igreja não está sob sua gestão. Sendo propriedade do Estado, é à "Direção-Geral do Tesouro e Finanças que compete assegurar a manutenção", esclarece. O JN questionou, sem êxito, esta entidade.
"Chove em vários pontos da igreja, faltam telhas, no quadro elétrico ouve-se a água a cair, tem vitrais partidos, musgo e fungos nas paredes e uma "floresta" no telhado", explica, desolado, o padre Manuel Sá Ribeiro, que, em outubro, completará 45 anos à frente da paróquia de S. Pedro de Rates.
"Acústica ímpar"
Todos os dias vê ali dezenas e, às vezes, centenas de peregrinos do Caminho de Santiago (passa por Rates), maravilhados com a beleza de "um exemplar único do românico condal". Quase sempre, à porta, há estudantes de Belas-Artes a desenhar. Uma vez por ano, porque é "uma igreja singular e com uma acústica ímpar", recebe o Ciclo de Música Sacra e o Festival Internacional de Música. "É monumento nacional e, por isso, não deixam a Paróquia intervir. Estamos de pés e mãos atados", atira Sá Ribeiro, indignado com o "estado calamitoso" da igreja.
"A última intervenção foi há 25 anos. Quando o Estado não é capaz de preservar o seu património, o que nos identifica e traz turismo, riqueza, pessoas, então não sei para que serve o Estado", desabafa Paulo João Silva, presidente da Junta.
Já contactou várias entidades. Em novembro, aproveitando a visita da diretora regional da Cultura, voltou à carga. Nada. A Câmara já expôs, por escrito, a situação ao Ministério da Cultura, à DRCN e à Direção-Geral do Tesouro e Finanças. Nada. Manuel Sá Ribeiro explica que lhe dizem que têm "imensos processos" e que "não há verbas".
Quem por ali passa lamenta o abandono e o pároco sofre ainda mais com isso: "As pessoas viram-se contra nós, porque acham que nós viramos as costas à igreja".
"Vamos distribuir dinheiro por tudo quanto é canto, quando nós temos aqui uma questão de primeira necessidade e não há verbas?!", questiona, lembrando que foram anunciadas 78 intervenções no património cultural, ao abrigo do Plano de Recuperação e Resiliência, no valor de 190 milhões. Mas nada para a Póvoa.
Construída no início do século XII
A Igreja de S. Pedro de Rates foi construída no período condal, no início do século XII. É um dos mais importantes monumentos românicos medievais do então emergente reino de Portugal. No final dos anos 90, as campanhas arqueológicas indicaram que a atual igreja está sobe uma outra, provavelmente do período suevo-visigótico. No século XIII, serviu como igreja do primeiro mosteiro da Ordem de Cluny (francesa). Até 1552, guardavam-se ali as ossadas de S. Pedro de Rates, o primeiro bispo de Braga.