O presidente da Câmara Municipal do Porto, Rui Moreira, afirmou, em Assembleia Municipal, que as obras de construção da sala de consumo assistido de drogas, prevista para a zona de Serralves, arrancaram nesta quinta-feira.
Corpo do artigo
"Felizmente, hoje [quinta-feira] iniciaram-se as obras", disse Rui Moreira, numa sessão da Assembleia Municipal, sem prestar mais esclarecimentos sobre o assunto.
A afirmação foi feita durante o debate sobre a prestação de contas em relação a 2021, em resposta à oposição, que criticou o executivo por ter ficado aquém na execução dos investimentos, num ano em que a receita ultrapassou o expectável.
Em 22 de fevereiro, a então vereadora da Ação Social da Câmara do Porto, Cristina Pimentel, disse que a intenção do município era avançar com a empreitada de preparação do terreno, onde seria instalada a sala de consumo assistido, por ajuste direto, mas que tal não era possível.
"Atendendo aos preços, que têm vindo a subir, e ao ajuste direto, no caso da contratação pública, ter um limite de 30 mil euros, não foi possível lançar o procedimento por ajuste direto", disse.
O município vai "lançar uma consulta prévia" para a empreitada de preparação do terreno onde será instalada a sala de consumo assistido, procedimento que demorará "cerca de dois meses", adiantou Cristina Pimentel.
A Câmara do Porto aprovou por unanimidade a atribuição de 270 mil euros ao consórcio "Um Porto Seguro", liderado pela Agência Piaget para o Desenvolvimento (APDES), para a gestão da sala de consumo assistido.
Depois de a gestão desta estrutura ter sido adjudicada ao consórcio encabeçado pela APDES, a Santa Casa da Misericórdia, que também concorria, interpôs uma providência cautelar contra o município.
A ação judicial foi indeferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que considerou que "os danos que resultariam da adoção da providência requerida são superiores aos prejuízos que podem resultar da sua não adoção".
A estrutura, que ficará instalada na chamada "Viela dos Mortos", na zona de Serralves, deverá funcionar 10 horas por dia, sete dias por semana, em horário proposto pela entidade gestora e validado pela Comissão de Implementação, Acompanhamento e Avaliação.
A equipa deverá ser composta por profissionais em permanência, tais como dois enfermeiros, um técnico psicossocial e um educador de pares, reforçada com profissionais a tempo parcial, nomeadamente um psicólogo (sete horas por semana), um assistente social (sete horas por semana) e um médico (quatro horas por semana).
O espaço, que se dirige a utilizadores de substâncias psicoativas ilícitas, por via injetada e/ou fumada, contará com o apoio da Câmara do Porto no montante global de 650 mil euros.
O Programa de Consumo Vigiado do Município do Porto resulta da cooperação entre várias entidades, na sequência de um protocolo assinado em 2020 para a criação de respostas deste tipo na cidade.
Contas aprovadas
Na Assembleia Municipal realizada na noite de quinta-feira foram aprovadas as contas de 2021 do município do Porto, com os votos favoráveis da bancada que apoia Rui Moreira, votos contra do BE e abstenção dos restantes grupos, no meio de críticas à execução.
As contas de 2021 da Autarquia, que apontam para um investimento de 81 milhões de euros, correspondentes a 30% da despesa total, e um saldo de gerência a transitar para 2022 de 94,3 milhões de euros, foram aprovadas na Assembleia Municipal da noite de quinta-feira, apenas com os votos favoráveis do grupo independente "Aqui há Porto".
O Bloco de Esquerda votou contra, e as restantes bancadas - PSD, PS, CDU e PAN - abstiveram-se, numa reunião em que o deputado único do Chega voltou a não estar presente.
"O ano de 2021, do ponto de vista orçamental, correu bem", afirmou o deputado do grupo independente "Aqui há Porto" Mário Amorim Lopes, apontando para uma "execução da despesa em máximos históricos", de 80%, e uma "receita acima do orçamentado".
Numa análise detalhada ao documento em que poucas foram as críticas, Nuno Borges, do PSD, considerou que "a política de redução de carga fiscal, com especial enfoque na redução da comparticipação do município no IRS, teria sido possível de contemplar em anos anteriores, e não apenas em 2022, que resulta do acordo do PSD com Rui Moreira".
Já a deputada Odete Patrício, do PS, lembrou declarações antigas em que o presidente da Câmara tinha anunciado uma "política orçamental contracíclica" em que se iria "abdicar de receita própria, sem descurar a necessidade de concretizar o orçamento previsto", e "aumentar a despesa com medidas de suporte social, económico e cultural".
A socialista referiu que a Câmara não abdicou de receitas quando estas cresceram e que "todas as despesas estratégicas ficaram aquém do respetivo orçamento".
Em resposta, Rui Moreira disse que a "taxa de execução superior à que estava orçamentada" demonstra "prudência" na "orçamentação da receita provisional", mas também que "as coisas não correram tão mal" como previsto, a nível nacional, e no Porto, em particular.
Sobre a não execução da totalidade dos investimentos previstos, justificou com obstáculos de contratação pública ou de execução de obras.
Para Joana Rodrigues, da CDU, estas contas são o "reflexo do que Rui Moreira tem feito ao longo de oito anos".
"É incapaz de aproveitar condições financeiras únicas de que município dispôs, mantém saldos orçamentais elevadíssimos e incompreensíveis, ao mesmo tempo que deixa arrastar investimentos fundamentais para a resolução de problemas crónicos da cidade", prosseguiu.
Susana Constante Pereira, do BE, revelou que ao partido "preocupa de sobremaneira a baixa execução e o investimento que parece residual na gestão da crise sanitária".
Da parte do PAN, Paulo Vieira de Castro sustentou a abstenção dizendo que "dinheiro existia, capacidade de endividamento também existia, não se fez porque não se quis".
Nova estrutura orgânica
Também a alteração da estrutura orgânica da Câmara Municipal foi aprovada, apesar da CDU ter acusado Rui Moreira de procurar, "por processos eticamente reprováveis, a almejada maioria absoluta" que perdeu em 2021.
A alteração foi aprovada com os votos a favor do movimento de Rui Moreira e do PSD, o voto contra da CDU, e as abstenções do PS, BE e PAN.
A vereadora Catarina Santos Cunha, eleita pelo PS, desvinculou-se do partido em novembro e reforçou a presença do grupo de Rui Moreira no executivo, depois de lhe ter sido atribuído o pelouro do Turismo e da Internacionalização.
Por outro lado, a ex-vereadora dos Transportes, Ação Social e Proteção Civil, Cristina Pimentel, deixou o executivo para ir presidir à STCP, tendo sido substituída por Fernando Paulo, que tinha sido vereador da Habitação e Coesão Social e da Educação no mandato anterior.
O comunista Francisco Calheiros acusou o executivo de impôr uma alteração que, "longe de ter em consideração a organização dos serviços municipais, procurou (...) garantir, por processos eticamente reprováveis, a almejada maioria absoluta que o povo do Porto, em consciência, decidiu retirar ao movimento Rui Moreira".
"Passámos a ter uma distribuição de pelouros com pouco de racional, e que apenas teve a preocupação de garantir a entrada de um vereador não eleito, a saída honrosa de uma vereadora eleita e a pesca à linha de uma vereadora com um programa distinto do da maioria", prosseguiu.
Rui Moreira classificou as afirmações de Calheiros como "um perfeito disparate" e lembrou que, "durante quatro anos, a CDU participou ativamente na governação do PSD, que tinha tido uma maioria relativa".
"Nem lhe vou dizer mais, porque não tenho tempo nem paciência, nem me parece adequado, porque o senhor não faz ideia o que é uma organização de serviços interna de uma Câmara Municipal", afirmou o autarca.
O presidente da Câmara referia-se ao primeiro mandato de Rui Rio em frente à autarquia, em que o comunista Rui Sá foi vereador do Ambiente, entre 2002 e 2005.
Também a atual vereadora sem pelouro da CDU Ilda Figueiredo assumiu o pelouro da Saúde e Sanidade no primeiro mandato do socialista Fernando Gomes nos comandos do município, em 1994.
O deputado comunista voltou a intervir em "defesa do camarada Rui Sá que, em 2001, não deixou a força política de que fazia parte para aceitar um pelouro, e isso fez toda a diferença".
Pela bancada do BE, Rui Nóvoa referiu o impacto da alteração orgânica nos trabalhadores implicados e lamentou que a gestão do centro histórico esteja a cargo da Sociedade de Reabilitação Urbana Porto Vivo, "bem mais distante do acompanhamento e fiscalização dos eleitos autárquicos".
Alfredo Fontinha, do PS, considerou que a "organização deverá estar assente nas reais necessidades da estrutura da Câmara para que haja um funcionamento eficiente dos serviços" e disse que "algumas delas se constituem como fatos à medida das pessoas".
Também Paulo Vieira de Castro, do PAN, disse que o processo levanta "dúvidas".
José Maria Montenegro, do movimento que apoia Rui Moreira, lembrou a "incontornável legitimidade do executivo e, portanto, do município do Porto, em organizar-se".
