Comércio histórico: "Quando viemos para cá, ninguém queria as lojas da Baixa" do Porto
Estabelecimentos históricos do Porto enfrentam processos de despejo devido à especulação imobiliária. Câmara diz que estão protegidos.
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Suspensa no ar como um sonho, a invenção de Felisberto desliza entre o passado e o presente da Casa dos Linhos, mas talvez nunca chegue ao futuro da secular loja da Baixa portuense, que vive há dois anos com a espada do despejo apontada pelo senhorio, com a exigência de um aumento estratosférico da renda - quer receber perto de nove vezes mais do que os atuais 700 euros por um espaço que vive da venda de miudezas, e, tal como outros proprietários do centro, avançou para tribunal.
"É uma pena, uma casa como esta...". Cabisbaixo, Felisberto Carvalho lastima: "Desaparecendo isto, é cultura que desaparece". Localizada na Rua de Fernandes Tomás, apesar de classificada como loja de tradição desde maio de 2018, vai-se tecendo a possibilidade de encerramento, ensombrando os dias dos dois sócios e dos clientes. O fenómeno multiplica-se: a Associação dos Comerciantes do Porto (ACP) conta 14 lojas encerradas só entre as perto de 110 que já obtiveram a classificação municipal, e o líder da ACP, Rubens de Carvalho, diz haver pelo menos mais "quatro em risco de fechar" em breve. Boa parte morre por não conseguir fazer face ao aumento das rendas, que subiram vertiginosamente com a especulação imobiliária inflamada pelo crescente apetite turístico pelo Porto. Ou seja, depois da crise que em 2011 trouxe a troika ao país e ditou o fim de vários estabelecimentos, os comerciantes da Baixa veem-se agora a braços com preços inflacionados: há senhorios a pedir rendas 10 vezes superiores ao valor atual e são arrendadas lojas por verbas que superam os 20 mil euros mensais e que têm sido ocupadas por multinacionais e negócios que vendem souvenirs a um euro.