Na Avenida Santos Graça, na Póvoa de Varzim, já lhe chamam "mamarracho". Há muitas dúvidas: a dimensão, o afastamento "mínimo" de vizinhos, os 40 metros de comprimento, um sótão que é, afinal, uma cobertura com piscina. Por queixa do deputado municipal Silva Garcia, alvo de inquérito no Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) do Porto. O presidente da Câmara, Aires Pereira, garante que tudo está dentro da lei.
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"A cumprirem-se o Plano Diretor Municipal (PDM) e o Plano de Urbanização (PU), seriam 720 m2. Assim são 2600 m2. É a diferença de quatro para 16 apartamentos", frisa Silva Garcia, eleito pelo PS, que, na última Assembleia Municipal, requereu "pela quarta vez" cópias do processo.
Alexandre Festas mora ao lado do novo imóvel: "É chegar aqui e olhar. Abro a janela e dou com o nariz no vizinho. Não é preciso ser especialista em urbanismo para ter dúvidas". Mora ali há 13 anos. Tinha como vizinha uma vivenda e uma "lindíssima magnólia". Agora, tem um bloco de betão com 40 metros de comprimento e mais de 15 de altura, a três metros da janela. Deixou de ter sol e, sobretudo, privacidade. Ele e quem for morar para o novo prédio. Pediu acesso ao processo. Recusaram-lhe. Os moradores já fizeram uma reclamação na Autarquia. Até agora, não há resposta.
Quanto ao afastamento aos edifícios vizinhos, diz Silva Garcia que, dada a altura do prédio, em vez de três metros "deviam ser pelo menos 6,5". O comprimento do bloco, tendo em conta o predominante na zona, deveria ser 15 e 20 metros e não os mais de 40 e o alegado sótão é, afinal, um andar recuado com duas piscinas que "aumenta ainda mais a volumetria já exagerada". Em suma, alega o arquiteto, "é mau para os vizinhos, para quem irá lá morar, para a cidade" e é a permissão para uma "inaceitável especulação do solo".
O deputado insiste que "há indícios fortes do não cumprimento" do PDM, do PU, dos regulamentos Geral das Edificações Urbanas e Municipal de Urbanização e Edificação e participou o caso ao Ministério Público, que afirma haver suspeitas de ilícito criminal e mandou o caso para o DIAP. A Câmara já foi notificada.
"Quem tem a responsabilidade de aprovação dos projetos é a Câmara e os técnicos do Município. Querem ser juízes em causa própria e isso não é possível", responde Aires Pereira. O presidente da Autarquia diz que o deputado já esteve a consultar o processo, mas, "cumprindo o Regulamento da Proteção de Dados", não lhe foram fornecidas cópias. Quanto ao edifício, está "tudo dentro da lei" e "cumprindo os instrumentos de gestão urbanística", conforme consta "do parecer técnico", assegura o autarca.
Chumbado duas vezes
O edifício Varandas da Graça foi chumbado na Câmara duas vezes. Do processo constam dois pareceres negativos. Passou à terceira, sem que, diz Silva Garcia, tenha havido alteração que o justifique.
Milhões em jogo
A construção começou em abril de 2022. São 16 apartamentos, mas deveriam ser quatro, diz Silva Garcia. A diferença seriam "seis milhões de euros de receitas".
Moradores acusados
Os moradores que reclamaram na Câmara receberam uma carta da empresa promotora na qual são acusados de estarem a ser "marionetas" de "pessoas externas". Alexandre Festas diz que nada os move contra o promotor que "só fez o que a Câmara permitiu."