Câmara quer recuar a passagem entre Árvore e Mindelo. Associação fala em atentado à biodiversidade e Inspeção do Ambiente manda parar.
Corpo do artigo
A Inspeção-Geral da Agricultura, Mar, Ambiente e Ordenamento do Território (IGAMAOT) mandou parar as obras nos passadiços da Reserva Ornitológica de Mindelo (ROM). Em causa está uma denúncia da Associação Pé Ante Pé (APAP). Os ambientalistas garantem que a obra vai destruir a duna secundária e muitos dos charcos onde nidificam os anfíbios. A Câmara de Vila do Conde acusa-os de querer “atrasar” o investimento no concelho.
O caso é antigo. Em 2018, a duna engoliu parte dos passadiços, entre Árvore e Mindelo, em plena ROM. Na altura, a autarquia ainda liderada por Elisa Ferraz já dizia que a solução seria o recuo dos passadiços. A APAP protestou. A obra nunca chegou a avançar.
Em dezembro de 2022, o mar invadiu a foz da ribeira de Silvares e destruiu a duna, mais à frente, em Mindelo. A Câmara, já com Vítor Costa ao leme, decidiu preparar uma “intervenção de fundo”. O concurso foi lançado a 2 de novembro de 2023 e a obra, orçada em 588 mil euros, adjudicada a 26 de janeiro de 2024. A ideia, explicava na altura Vítor Costa, era recuar o passadiço “100 a 150 metros” entre Árvore e Mindelo e depois reparar os buracos e as tábuas nos sete quilómetros de costa até à foz do rio Onda, em Labruge.
A Pé Ante Pé garante que tentou sensibilizar a autarquia. “É a única duna secundária que existe no concelho. Seria uma perda irreparável ao nível da biodiversidade”, explica Pedro Martins, biólogo e presidente da associação, lembrando que ali, onde o projeto prevê colocar, “de forma absolutamente insensível”, os passadiços, “estão muitos dos habitats da Rede Natura 2000” (protegidos por legislação comunitária). De nada valeu. Seguiram-se as denúncias a “todas as entidades possíveis”.
“Questão burocrática”
A Câmara garante que a empreitada, que “inclui a reposição de areia na duna primária de Mindelo (já executada), o recuo e recuperação do passadiço, a reposição do cordão dunar e outros trabalhos”, tem “todos os pareceres favoráveis”, desde a Área Metropolitana até à Agência Portuguesa do Ambiente, entre outras.
Pedro Martins considera que a obra “viola o regulamento daquela paisagem protegida” e já tentou, por várias vezes, ver o projeto e os pareceres. Nunca conseguiu. O conselho diretivo da ROM, cujo parecer é “obrigatório e vinculativo”, não foi “tido nem achado”.
Vítor Costa diz que “à data do início da empreitada era impossível obter esse parecer, pois o referido conselho não estava constituído”, mas no próprio site municipal, a 7 de setembro de 2021, é anunciada a sua primeira reunião e, na rede Linkedin, Fernanda Órfão autointitula-se presidente “desde outubro de 2023”.
A IGAMAOT não teve dúvidas e mandou, agora, parar a obra, iniciada em abril. Vítor Costa reage e diz tratar-se de uma “questão exclusivamente burocrática”, que, garante, “será regularizada já na próxima reunião desse órgão”.