Cobrança arrancou em dezembro de 2011. Extintas vias sem custos para o utilizador perderam automobilistas e descontos ficam aquém do esperado.
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"Dez anos de um autêntico calvário para o Algarve". É desta forma que a Comissão de Utentes da Via do Infante caracteriza a cobrança de portagens na A22, iniciada a 8 de dezembro de 2011. Na mesma altura, passaram a ser portajadas a A23 (Torres Novas-Guarda), a A24 (Viseu-Chaves) e a A25 (Aveiro-Vilar Formoso), antigas autoestradas sem custos para o utilizador (scut), que servem o interior o país.
Após uma década de cobranças, os utentes da Via do Infante defendem que as tarifas impostas, pelo então Governo PSD/CDS de Pedro Passos Coelho, tiveram um impacto "muito negativo e injusto" no Algarve.
"A mobilidade na região regrediu mais de 20 anos e as desigualdades territoriais agravaram-se", sustentam, acrescentando que "os prejuízos económicos e sociais têm sido muito elevados". Pior foram as "muitas vidas que se perderam". "As portagens obrigaram ao desvio em massa do trânsito para a Estrada Nacional 125", onde, desde essa altura, ocorreram mais acidentes rodoviários.
Em dezembro de 2010, um ano antes das portagens, circulavam por dia na A22, em média 12732 condutores. Um ano depois, já com as tarifas em vigor, a Via do Infante perdeu cerca de metade dos utilizadores (6204). Tendo como referência o último mês do ano, só em dezembro de 2019 é que voltaram a circular na autoestrada diariamente mais de 10 mil automobilistas (11201), de acordo com o Instituto da Mobilidade e dos Transportes.
Já na A23, comparando os meses de dezembro de 2010 e de 2011, registou-se uma perda diária de 2185 condutores. Com as portagens, esta autoestrada que liga Torres Novas à Guarda nunca teve mais de 10 mil utilizadores no último mês do ano, como era hábito. Já a A24, entre Viseu e Chaves, perdeu 1968 automobilistas. A A25, que é uma das principais vias exportadoras do país, registava 13 157 passagens diárias em dezembro de 2010. Um ano depois, com as portagens, circulavam menos 2296 veículos. Após a introdução das tarifas, a autoestrada que liga Aveiro a Vilar Formoso foi perdendo utilizadores todos os anos. Começou a recuperar tráfego a partir de 2016. Nas antigas scut deixaram de circular milhares de utilizadores, com os condutores a procurarem outros caminhos para escapar às portagens e à perda de rendimento, mas nem todas as vias têm alternativas viáveis.
marchas lentas e buzinões
A "fuga" às cobranças foi e continua a ser protagonizada por cidadãos, mas também por empresas. "Continuamos a usar os troços antigos", explica Nélson Sousa, da transportadora JLS, sediada em Viseu. O empresário estima gastos anuais de 600 mil euros com as portagens. O também dirigente da Antram garante que há empresas que gastam ainda mais.
A introdução de cobranças nas antigas scut foi acompanhada por um regime de isenções e descontos, que ainda assim não calaram as vozes de protesto. Realizaram-se marchas lentas, buzinões entre outras ações de luta. A contestação foi, ao longo dos anos, perdendo força, mas a oposição às tarifas continua viva.
No último verão, a Comissão de Utentes Contra as Portagens na A25 e A24 apresentou, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu (TAFV), uma ação popular contra o Governo, exigindo o fim das portagens nas ex-scut. O TAFV decidiu enviar o processo para o Supremo Tribunal Administrativo. "Avaliado o resultado no tribunal, logo veremos outras ações de luta", refere o porta-voz da Comissão, Francisco Almeida.
No Algarve, a Comissão de Utentes da Via do Infante exige "para já" a suspensão da cobrança "enquanto a EN125 não for totalmente requalificada", como foi aprovado num projeto de resolução em junho de 2020 no Parlamento.
"Perante a continuação da crise no Algarve, a Comissão de Utentes pondera regressar às movimentações de rua em 2022, procurando envolver outras entidades da sociedade civil com o objetivo de terminar de vez com as portagens na região", avisa.
Polémicas
Mais descontos
Com a introdução das portagens, circular na A22 passou a custar 11,60 euros (classe 1). Percorrer a A23 ficou a 19,30 euros. A passagem na A24 custava 14 euros. Já a A25 ficava a 15,65 euros. No início do ano, entram em vigor novos descontos nestas ex-scut.
Novos protestos
"As portagens são uma entorse ao desenvolvimento económico e social e uma injustiça para com o interior. Já foram atingidas algumas reduções, mas é preciso continuar este processo de redução até à abolição", defende Luís Garra, membro da Plataforma Pela Reposição das Scut na A23 e A25.