Ex-chefe dos serviços jurídicos admitiu que mensagens indiciam ligação ao Parque da Cidade.
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A Câmara do Porto remeteu para a comissão eventual de inquérito às construções na escarpa da Arrábida documentos sobre o parecer favorável de 2009 do jurista Pedro Gonçalves, no sentido de demonstrar que a sua contratação foi posterior, em 2010, e por isso ilegal. A documentação enviada pelos serviços da Autarquia sustenta ainda a relação entre o processo urbanístico e o acordo conseguido pelo ex-presidente da Câmara, Rui Rio, para o Parque da Cidade. Também ontem, a comissão ouviu Cristina Guimarães, ex-chefe municipal dos serviços jurídicos, sobre a troca de emails que indicia que a concessão de capacidade construtiva serviu de contrapartida.
Do dossiê que a comissão recebeu dos serviços de apoio aos órgãos jurídicos, destacam-se documentos sobre a encomenda dos serviços àquele especialista em contratação pública. Poderão sustentar uma eventual queixa da Assembleia Municipal ao Ministério Público, como já foi sugerido por membros da comissão.
Esta semana, a Câmara já havia enviado à comissão esclarecimentos sobre a data de entrada do parecer de Pedro Gonçalves, dizendo que a primeira referência ao parecer era posterior ao Pedido de Informação Prévia (da empresa Arcada) deferido pelo ex-vereador Lino Ferreira, em fevereiro de 2009, sobre as construções na Arrábida. Transmitiu que não foi encontrado em 2009 qualquer procedimento de adjudicação relativo à sua contratação, referindo apenas um ajuste direto para prestação de serviço, mas em 2010.
Pagamento em 2010
Agora, um dos documentos enviados é da chefe da Divisão Municipal de Contencioso e Notariado para a diretora do Departamento Municipal Jurídico e de Contencioso, com data de fevereiro de 2010. Refere que Pedro Gonçalves é o mais indicado para prestar assessoria jurídica no âmbito do dossiê do Parque da Cidade.
Na justificação de uma despesa de 30 mil euros, é dito que, "no contexto de uma longa e complexa série de procedimentos urbanísticos e de decisões jurídico-administrativas, tácitas e expressas, tomadas pela Câmara do Porto, impôs-se dirimir uma série de conflitos e interpretações de um número elevado de contratos celebrados pelo Município no âmbito de um processo relacionado com o Parque da Cidade".
A Autarquia juntou agora a este documento outro de julho de 2010 com uma ordem de pagamento da sociedade Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados, de que faz parte Pedro Gonçalves, remetida a Cristina Guimarães, com 30 250 euros em "honorários pelos serviços prestados até esta data com a elaboração de parecer para a Câmara do Porto - Imoloc (imobiliária que antecedeu a empresa Arcada).
Cristina Guimarães foi confrontada na comissão com a troca de emails de 2009 em que refere urgência de parecer favorável quando Rio queria anunciar o acordo do Parque da Cidade. A troca inclui Fernanda Paula Oliveira, consultora externa, a encomendar parecer a Pedro Gonçalves sobre a escarpa. Segundo membros da comissão, Cristina Guimarães disse não se lembrar dos emails, mas admitiu que indiciam uma ligação entre os dois processos.
TROCA DE EMAILS
Numa troca de correio eletrónico a 14 de julho de 2009 lida ontem na comissão, Cristina Guimarães, que chefiou a divisão municipal dos serviços jurídicos no tempo de Rui Rio, refere-se à reunião do autarca onde teria sido combinada a alegada cláusula que liga o Pedido de Informação Prévia relativo à Arrábida aos acordos do Parque da Cidade. Nessa troca, a jurista Fernanda Paula Oliveira, consultora externa da Câmara, pede parecer a Pedro Gonçalves sobre a escarpa.
Cristina Guimarães para Fernanda Paula Oliveira
"Sem querer pressionar, soube agora que está marcada uma conferência de imprensa pelo senhor presidente sobre este assunto para o final da manhã de amanhã. Claro que só acontecerá se tivermos fumo branco. Os espanhóis - que sucederam à Imoloc - só assinam o protocolo (cuja escritura está marcada para amanhã à tarde) se houver algum sinal positivo no processo. Houve uma megarreunião ontem sobre este protocolo e fizeram pé firme neste ponto. Esta relação entre o PIP e o protocolo é, todavia, sigilosa, pelo que pedia que transmitisse ao dr. Pedro Gonçalves este dado. O que a dra. Manuela [ex- -diretora municipal dos serviços jurídicos Manuela Gomes ] está a ponderar é que o vereador pratique o ato de revogação (ou de reconhecimento da revogação implícita), caso tenhamos a indicação do dr. Pedro Gonçalves de que emitirá parecer".
Fernanda Paula Oliveira para Pedro Gonçalves
"A questão, como verás, é a de podermos agora reconhecer que ainda há direitos decorrentes do PIP de 2002 (o qual temos de fazer ressuscitar) para podermos deferir um pedido de licenciamento à Imoloc (pressuposto para que o acordo quanto à indemnização do Parque da Cidade seja aceite)."
DETALHES
Comissão ainda à espera de Rio
A comissão eventual de inquérito às construções na escarpa da Arrábida ainda não tinha ontem resposta de Rui Rio, atual presidente do PSD, sobre o convite que lhe foi feito para prestar esclarecimentos nesta estrutura, sobretudo sobre a alegada relação entre a luz verde dada às construções e os acordos para o Parque da Cidade.
Deputados vão preparar relatório
A comissão criada pela Assembleia Municipal vai terminar os trabalhos no dia 11 de dezembro e irá depois elaborar um relatório que será apreciado por todos os deputados.