Para já são dezenas, mas se o tribunal determinar o encerramento da Felpos Bomdia, no dia 11, podem ser centenas as pessoas a ir parar ao desemprego.
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Os 36 trabalhadores despedidos pela Felpos Bomdia, em Vizela, dirigiram-se, esta segunda-feira de manhã, à administração da empresa para recolherem a documentação para o fundo de desemprego. Estes funcionários, alguns com dezenas de anos de casa, foram surpreendidos, na sexta-feira, com cartas de despedimento com efeito a partir de sábado.
Os trabalhadores não estão certos da legalidade dos despedimentos, "feitos sem pré-aviso e sem autorização do administrador de insolvência", mas também não encontraram ninguém da administração a quem questionar sobre o assunto. Os cem trabalhadores da Felpos Bomdia, entre estes os que foram despedidos na sexta-feira, não receberam o subsídio de Natal de 2022. Este ano, só receberam parte do salário de janeiro e têm os ordenados de fevereiro e março em atraso.
Fernando Alves trabalhava na Felpos Bomdia há 33 anos. "Há muito tempo que sabia que as coisas não estavam bem", disse, após sair dos escritórios da empresa com um documento que não sabe se tem validade. "Vou agora ao Centro de Emprego a Guimarães, mas não sei se vão aceitar isto. A empresa está em processo de insolvência desde fevereiro e eu não sei se eles podem despedir funcionários nesta situação", interroga-se.
"Já há muito tempo que sabíamos que isto não estava a trabalhar bem, mas diziam-nos que ia melhorar e nós demos-lhes um voto de confiança. Faltavam encomendas, não havia matéria-prima para pôr o trabalho a andar e faltava organização por parte da chefia", queixa-se. Fernando Alves acaba de perder a esperança de vir a receber os salários que tem em atraso sem ser por via judicial e precisa desesperadamente do fundo de desemprego para "andar com a vida."
Marido e mulher despedidos
"Há famílias em situações aflitivas. O meu irmão e a minha cunhada foram os dois mandados embora", conta Fernando Faria, funcionário na empresa há 38 anos. "Eu vim para aqui com 14 anos, o meu irmão trabalhava aqui ainda há mais tempo", lamenta, juntando-se ao protesto dos que foram dispensados, apesar de não ser o seu caso.
Daniel Mendes tem 37 anos, também entrou na empresa com 14 anos e diz que não compreende o critério para os despedimentos. "Disseram que iriam as pessoas mais velhas, mas isso não é verdade porque, na mesma secção, funcionários com mais idade ficaram e outros, mais novos, foram embora. É uma questão de quem é amigo ou familiar dos chefes", acusa.
Os trabalhadores queixam-se de terem confiado na administradora, Alexandrina Lemos, "que foi dizendo que isto ia melhorar." Fernando Alves não concorda com as razões evocadas pela administração no processo de insolvência. "Antes da covid-19 isto já não estava a funcionar bem e a guerra agora é desculpa para muita coisa", afirma.
Segundo Fernando Faria, a tecelagem da empresa está parada porque dez trabalhadores deste setor suspenderam os seus contratos. "Nós devíamos ter feito o mesmo, agora não nos podiam fazer isto", atira. "Parece uma empresa fantasma", diz Daniel Mendes, "quem entrar lá dentro até se assusta, com as luzes todas apagadas".
Para os trabalhadores, o problema da empresa é a falta de entendimento entre os acionistas, três irmãos e a viúva de um quarto que é a administradora. "Dão-se tão mal que a Alexandrina Lemos proibiu os outros três de entrarem nas instalações", aponta Daniel Mendes.
Tem uma dívida a rondar os 2,5 milhões de euros
"A Bomdia vive atualmente uma situação de desequilíbrio financeiro que decorre da conjugação simultânea de vários fatores, uns exógenos e outros endógenos à sociedade. Quando se começavam a normalizar os constrangimentos causados pela pandemia - tivemos o impacto inesperado causado pela guerra da Rússia na Ucrânia que potenciou o aumento dos preços da energia", lê-se no processo de insolvência, apresentado no dia 27 de fevereiro.
A lista provisória de credores da Felpos Bomdia aponta para uma dívida a rondar os 2,5 milhões de euros, alguns a pequenas e microempresas da região. O tribunal decide o destino da empresa no próximo dia 11, data em que se realizará a assembleia de credores, e o prazo para a reclamação de créditos terminou no dia 24 de março.
Fundada em 1933, a Fábrica de Tecidos de Viúva de Carlos da Silva Areias & Cª, mais conhecida como Felpos Bomdia, sobreviveu à II Guerra Mundial, ultrapassou a ditadura e o período após o 25 de Abril. Desde 1973, mudou a produção para uma unidade de grandes dimensões, à entrada de Vizela.