Já se sabe que também este ano não vai haver noitada de S. João, por causa da pandemia. O Porto faz o que pode para limitar os danos, morais e económicos, abre parques de diversão e solta odores das festas juninas. Fontainhas, Lordelo e Boavista fazem o arraial possível.
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Ao cabo de 15 meses, o Porto solta-se aos poucos das amarras sanitárias da covid-19 e desconfina-se como pode, a ponderar todas as matrizes de risco. E foi assim, pelo último fim de semana de maio, que se instalou na cidade um certo clima de folia pré-joanina.
Foi-se a grande maioria dos ingleses que esgotaram os barris de cerveja e que inundaram a cidade com os cânticos da bola, ficaram os carrosséis das emoções fortes, as farturas salivares ou os prosaicos matraquilhos, que atraem grandes e pequenos aos parques de diversão montados nas Fontainhas, na Boavista e em Lordelo. Um alívio para os empresários, ávidos de reequilibrar as finanças. Para os foliões, resta a sensação de fuga a todos os constrangimentos.
"Estes foram meses muitos duros, a todos os níveis, sem ajuda de ninguém. Temos de agradecer à Câmara do Porto por não nos cobrar qualquer taxa", afirma Rosa Silva, de 65 anos, feirante, proprietária da "Sai sempre prémio", garantia de investimento a quem aposta nas rifas da barraca de peluches.
"Só pagamos a luz. Temos de agradecer o apoio da Câmara do Porto. Ando nisto há 50 anos e estes são os tempos mais difíceis", acrescenta outro feirante, José Tagaio, de 59 anos, proprietário da "Scalextric", uma pista de carrossel infantil.
"É o primeiro dia de liberdade", disse ao JN António Castro. Para este portuense de 80 anos, o domingo soalheiro serviu para relembrar ao palato os sentidos da bela fartura. "Viemos para isso, pela fartura, e para desfrutar desta sensação de liberdade", atalhou a esposa, Julieta Castro, de 67 anos.
No Porto visceral, das Fontainhas e de Lordelo, como na Rotunda da Boavista, foram milhares os domingueiros que retomaram as perceções da normalidade possível e ainda controlada a álcool-gel, a medições de temperatura e a todas as medidas básicas, como o distanciamento social, que se afigura com um paradoxo nos carrinhos de choque. Menos nos vulgares carrosséis.
Leonardo, de quatro anos, deliciou-se às cavalitas circulares. E os papás também. "Após um ano metidos em casa, a lidar com o stress e com a frustração, esta é uma sensação de liberdade, uma luz ao fundo do túnel", diz Vítor Carvalho, portuense de 50 anos.
Ali ao lado, nos matraquilhos, também pai e filho se libertavam das agruras do confinamento, mas num evidente conflito geracional, nos velhos antagonismos da bola. "Ó pai, eu não jogo por esses. Vai para lá tu, que eu sou do Porto", impôs-se David, de sete anos. O pai, José Wilson, de 63, anos, também acatou a derrota parcial, cifrada em 2-0, à hora do encerramento da reportagem do JN.
Para José Wilson, todas as saídas agora são viáveis e com outros triunfos em vista: "Foram meses muito duros. E esta sensação de liberdade faz-nos bem. Espero que tudo reentre rapidamente na normalidade, ainda que com cautelas. O que não é aceitável é suceder, como me sucedeu a mim, ter de fechar um café um bar nas galerias e, depois, ver o que se passou estes dias com os adeptos ingleses", concluiu o conhecido empresário portuense do ramo da restauração.