O homem que agora mostra numa banca, com orgulho, os produtos biológicos que trata com carinho em Chaves já foi investigador na Universidade de Coimbra e na Universidade Católica de Lisboa. E aquele que passou uma parte da vida a trabalhar num hipermercado do Porto, apresenta-se agora, ufano, debaixo do seu "estendal" de salpicões, chouriços, alheiras e outras delícias do fumeiro flaviense. Dois citadinos que se tornaram agricultores no Interior e que têm presença assegurada na Feira dos Sabores de Chaves, que vai decorrer de 17 a 19 deste mês.
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Anísio Saraiva começou a fartar-se da vida que levava como investigador de História Medieval e um dia conversou com a mulher, Ana, natural de Coimbra, técnica de turismo, se não seria melhor mudarem de vida. A mãe dele é natural de Vidago (Chaves) e, embora não tivesse nascido nem vivido lá, gosta da terra e da região. Pensou que talvez não fosse má ideia irem para lá ter uma existência "menos stressante".
"Um salto de fé"
A "aposta de coragem e de futuro" ficou fechada em família, que incluiu a filha, Vitória, que hoje tem 13 anos. Recuperaram uma casa e terrenos de família abandonados, compraram terras de vizinhos e iniciaram um negócio de produtos biológicos certificados chamado Torrão da Terra. Não só cava, planta, rega e colhe, como os entrega em cabazes semanais à porta de quem os encomenda. "Melhorámos a nossa qualidade de vida", resume.
O antigo investigador não se fartou da História Medieval, mas de "tudo o que girava à volta desta área profissional". "A decisão que só era expectável ser tomada após a reforma foi fixada aos 45 anos". Deram um "salto de fé". "Largámos tudo e começámos do zero, junto daquilo que consideramos ser essencial: natureza, vida mais tranquila e próximos do que entendemos ser o que nos basta para o dia a dia. Na cidade nunca estamos satisfeitos e vivemos como um hamster numa roda, sem perceber que nos cabe a nós parar essa roda", explica. Agora, o objetivo é "aumentar a produção", "chegar a mais público" e "acrescentar à horta o turismo de experiências".
"Decidimos arriscar e vir fazer qualquer coisa"
Agostinho Fontoura, 41 anos, é natural de São Vicente da Raia, em Chaves, mas foi ainda adolescente viver para o Porto, onde mais tarde conheceu a mulher, Catarina Santos, 44 anos. Viveram lá duas décadas e trabalhavam num hipermercado quando decidiram mudar de ares. "Não estávamos satisfeitos e decidimos arriscar e vir para cima fazer qualquer coisa", recorda.
Atualmente têm a Cozinha Regional de São Vicente da Raia, onde produzem fumeiro, mas também têm "porcas parideiras, cujos leitões são vendidos para restaurantes de Vila Real". Catarina trabalha ainda num lar de idosos. "Um rendimento extra que tem de ser, senão não chega", sorri Agostinho Fontoura.
Já se arrependeram? "Às vezes, sim", admite, explicando que na cidade "trabalhava oito horas e iam para casa", o que na aldeia e com a vida que escolheram "é impensável".
Apesar de tudo, "a qualidade de vida compensa e os meus pais sempre têm a neta por perto", conclui Agostinho Fontoura.
"Canto Bio" na Feira dos Sabores
Foi na cozinha regional de São Vicente da Raia que ontem foi apresentada a Feira dos Sabores de Chaves, que este ano se realiza de 17 e 19 deste mês e que tem como novidade o "Canto Bio", onde Anísio Saraiva marcará presença. "Concelhos como os do Alto Tâmega têm de apostar na diferenciação e é fundamental terem um papel num segmento que tem vindo a ganhar importância", destacou o presidente da Câmara de Chaves, Nuno Vaz.