<p>Nas últimas semanas ou meses, ninguém sabe precisar uma data, ladrões de arte sacra foram à ermida da Senhora de Rodes, em Castro Daire, e furtaram retábulos e pinturas do século XVII. O povo não se conforma com a perda.</p>
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Embora desconheça o valor material das peças, uma das habitantes de Grijó de Gafanhão, que não quer ser identificada, confessa ter "chorado muito" quando soube do desaparecimento da arte sacra de finais do século XVII: dois retábulos laterais em talha dourada e todas as tábuas pintadas dos 20 caixotões em madeira que revestiam totalmente o tecto do altar mor.
O furto foi detectado na tarde de 20 de Setembro por membros da Irmandade de Nossa Senhora de Rodes que, alertados para a eventual queda do tecto da capela, pretendiam avaliar a dimensão dos prejuízos e estudar a forma de arranjar dinheiro para a sua recuperação.
"Quando lá chegaram, nem precisaram de chave. A porta lateral do templo tinha sido estroncada com um pé de cabra e lá dentro só havia lixo. O que tinha valor desapareceu", relata desolado Marcos Almeida, presidente da Junta de Freguesia de Gafanhão.
O autarca admite que o isolamento da capela - construída em 1141 no alto do monte das Cabeçadas, entre as freguesias de Gafanhão e Reriz, pelo ermitão Liovigildo Pires - tenha atraído a atenção dos amigos do alheio. "Como a capela está afastada das povoações, os ladrões trabalharam à vontade", acrescenta.
A mesma tese é corroborada por Fátima Eusébio, coordenadora dos Departamento dos Bens Culturais da Diocese de Viseu. "O isolamento da ermida, no meio da serra, já tinha levado a que de lá fossem retiradas todas as imagens por razões de segurança. Inclusive a de Nossa Senhora de Rodes que está guardada na Igreja Matriz".
Doutorada com uma tese que versou a talha na diocese de Viseu, a investigadora, que há meia dúzia de anos fotografou, um a um, todos os caixotões e retábulos da Senhora de Rodes, reconhece tratar-se de uma grande perda para o património religioso.
"Apesar da degradação, eram peças muito valiosas. Os retábulos, interessantes do ponto de vista estilístico, faziam a transição do maneirismo para o barroco. Os caixotões, do mesmo período, tinham representações figurativas de santos todos com a respectiva identificação".
A responsável defende a retirada para locais seguros, mais perto das populações e com culto regular, da arte sacra existente em capelas isoladas.
Quem também lamenta o assalto à Senhora de Rodes, é Arménio Vasconcelos, director do museu da Fontinha, em Castro Daire. "Além da talha, estamos a falar de pinturas ingénuas e simples, feitas em madeira, de grande valor histórico e sentimental".