A Câmara do Fundão pediu ontem "urgência" na aprovação de apoios para os agricultores, na sequência do mau tempo da tarde de domingo, que arruinou "completamente" o ano agrícola, com prejuízos que podem ascender a 20 milhões de euros só naquele concelho.
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É quase tanto como os estragos deixados pelo granizo na região que mais maçã produz em Portugal, Távora-Varosa. A destruição nos frutos vermelhos não se ficou pela cereja do Fundão. Toneladas de mirtilos de Sever do Vouga, capital da "baga da longevidade", foram ao chão.
A agricultura no Fundão, mas também na Covilhã (caixa ao lado), "é uma das maiores fontes de rendimento e de sustentabilidade económica, social e ambiental", frisa o presidente da Câmara, Paulo Fernandes. A trovoada de anteontem prolongou-se durante mais de uma hora com queda intensa de granizo, chuva e vento. O autarca frisa que os prejuízos abrangem "todas as fileiras produtivas" do concelho, nomeadamente a da cereja que já se debatia com perdas graves, bem como do pêssego, vinha e olival.
"Se até domingo estávamos numa situação de calamidade produtiva na fileira da cereja, com perdas superiores a 80%, agora já estamos a falar de mais de 90%. Temos todas as fileiras produtivas da agricultura do concelho afetadas", apontou Paulo Ribeiro, dirigente da Cerfundão, empresa que comercializa fruta.
O setor agroindustrial no concelho representa cerca de 100 milhões de euros por ano. Paulo Fernandes iniciou diligências junto da Direção Regional de Agricultura, das associações produtivas da região e do Governo e irá enviar um pedido de reunião "urgente" à ministra da Agricultura, Maria do Céu Albuquerque, que em visita recente ao concelho prometeu estudar uma linha de crédito bonificada para a fileira da cereja.
"ovos" caídos do céu
Em Sever do Vouga, "capital do Mirtilo", meia dúzia de minutos de granizo do tamanho de "ovos" arrasou várias plantações, especialmente nas freguesias de Rocas. Pelo menos cerca de 30 produtores que vendem para as cooperativas Mirtilusa e Bagas de Portugal foram afetados. "Temos agricultores que perderam praticamente tudo", revelou ao JN o responsável da Mirtilusa, José Carlos Sousa, que fala em perdas de cinco a seis toneladas entre os seus, alguns já no município vizinho de Oliveira de Frades. Paulo Nogueira, presidente da Bagas de Portugal, adiantou que a média dos prejuízos dos cerca de 20 associados afetados rondou 40%.
Frederico Barbosa, 40 anos, ia colher hoje 200 quilos de mirtilo das árvores plantadas em um hectare e meio de terreno em Rocas. Ontem, cerca de 60% dos frutos vermelhos estavam no chão. A "granizada" das 19 horas de anteontem custou-lhe 5000 euros. "Em oito anos de produção, nunca vi nada assim, era granizo enorme, do tamanho de ovos", contou ao JN. Num ano já negro, pelo cancelamento da Feira do Mirtilo, que iria realizar-se no final deste mês, devido à pandemia, o mau tempo foi mais um "rombo".
Pormenores
Explicação - Foi um episódio "típico da primavera", apesar das dimensões "extremas" do granizo, adiantou ao JN Patrícia Marques, do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA). "Na península havia uma depressão. E o aquecimento, aliado à humidade, causou o crescimento de nuvens a grande altitude. Quanto mais altas, mais gelo têm, o que originou aquele granizo", explicou a meteorologista.
Locais mais afetados - A grande quantidade de precipitação registou-se no Fundão, Sever do Vouga, Tarouca e Góis. Também "fora do normal" foi a quantidade de descargas elétricas registadas na trovoada.