Cerca de 40 médicos em greve partiram esta terça-feira de manhã, de autocarro, de Viana do Castelo rumo a Lisboa para participarem na manifestação à junto ao Ministério da Saúde.
Corpo do artigo
Apesar da chuva e do vento fortes, o grupo quis marcar posição na luta pela melhoria de salários e condições de trabalho no SNS, numa altura em que as negociações com o Ministério da Saúde estão num impasse. Segundo o médico cirurgião e dirigente da FNAM, Paulo Passos, a expectativa em termos de adesão à greve em Viana do Castelo é que seja "forte", podendo vir a rondar os "90 por cento".
"É capaz de ser maior do que as anteriores. Vejo pessoas que, habitualmente, não faziam greve dispostas a fazer", disse antes da saída para Lisboa, indicando que um dos efeitos da paralisação seria provavelmente o encerramento total dos blocos operatórios, que se confirmou.
Apesar da força da jornada de luta, Paulo Passos entende que há "uma pequena esperança" em relação às negociações com o Ministério de Manuel Pizarro. "Pela primeira vez, o Governo apresentou uma proposta que se pode discutir. Algumas questões ainda estão longe daquilo que queremos, mas, pelo menos, deram um pequeno sinal positivo", referiu, considerando que "a passagem para as 35 horas" corresponde a uma das aspirações dos médicos.
No autocarro de Viana do Castelo, seguiu Tatiana Lima, de 25 anos, uma médica recém-formada e desiludida com o ofício que escolheu.
"A vida que sonhei na Medicina não é bem aquela com que me estou a deparar hoje em dia. As condições que estamos a ter no hospital (de Viana do Castelo) e a formação que estou a ter, não são o que estava à espera", afirmou. "Vou a Lisboa porque quero lutar pelo meu futuro, quero uma formação mais adequada, não quero servir para tapar buracos, basicamente é isso que eu tenho feito muitas vezes. E sinto que, às vezes, as responsabilidades que me são dadas são demasiadas para o nível que eu ainda tenho", lamentou.
"Sou médica interna do ano comum, vou escolher a minha especialidade só no final deste ano e começar a ter internato. Terminei o curso no ano passado e entrei no SNS este ano e, começando a trabalhar e a aprender algumas coisas extra, vi o estado em que as coisas estavam", relatou a médica natural de Viana do Castelo e que ainda vive com os pais, acrescentando que "a falta de material é recorrente".
"Melhores condições e melhores salários"
Do grupo de médicos que tirou o dia para participar na manifestação desta terça-feira à tarde fazem também parte Sara Silva e Maria Torres, que trabalham no serviço de Ginecologia e Obstetrícia no hospital de Viana do Castelo. Queixam-se de perturbações constantes e excesso de horas no trabalho.
"Este ano, para assegurar a urgência, eu já devo ter mais de 500 horas-extra. Estou cansada. Vivo com uma pessoa que não me vê em casa. Está sempre a perguntar: hoje vens dormir a casa? E não pode ser assim", comentou Sara Silva.
Maria Torres considerou que "é preciso motivar as pessoas para continuar a trabalhar". "As nossas grávidas no Alto Minho ainda conseguem ter o parto no nosso hospital, sem terem de se deslocar a outras cidades. Ainda temos asseguradas as condições, em detrimento do fecho de consultas, de ecografias, de blocos operatórios. Para nós, internos, isto corresponde a uma perda de formação diária", descreveu, considerando que "os colegas mais velhos estão cansados das condições que se têm estabelecido ao longo dos anos. As pessoas estão fartas".
Por seu turno, Tiago Baptista, membro da direção do Sindicato dos Médicos do Norte, confessou que os médicos não queriam ir a Lisboa, mas continua a haver "um Ministério e um Governo, em geral, que não se aproxima minimamente das pretensões que nós consideramos justíssimas".
"O que o Governo faz é atirar com aumentos de salário que, não sendo suficientes, são ainda acoplados a aumento de trabalho", defendeu, considerando que, até agora, "o Ministro da Saúde não enviou nenhum documento nem teceu nenhuma proposta formal. Fez uma apresentação powerpoint em que parece abrir a porta a que se possam discutir alguns pontos. No entanto, isto demonstra amadorismo ou má fé e eu estou em crer que será a segunda".