Juntar as palavras "aposta", "design", "competitividade" e "diferenciação" numa fase em que se fala da indústria do mobiliário tem sido lugar-comum nos últimos anos. O design é sempre apontado como um dos caminhos para demarcar o mobiliário produzido no país, permitindo a internacionalização deste produto que é o ex-libris de Paços de Ferreira.
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Mas o que tem sido feito será suficiente? Cinco designers da região são unânimes ao dizer que não. Ainda há muito a fazer pelo design no sector do mobiliário. Os pacenses têm o know-how necessário, mas falta ainda mudar mentalidades. As empresas têm que perceber que o custo de não apostar no design pode ser mesmo mais alto que apostar nele, explicam os designers.
Outra lacuna que identificam é a falta de articulação entre escolas, empresas e designers. A indústria muitas vezes demonstra pouca abertura para acolher projectos e colaborar com as centenas de criativos que todos os anos saem das universidades.
Opiniões convergentes
São cinco os rostos que dão a cara para falar do estado do design do mobiliário na região: Rui Alves, designer pacense premiado internacionalmente; Paulo Ramunni, designer com produção própria e marca reconhecida dentro e fora do país, sedeado em Penafiel; Ana João Silva, designer da AM Classic Furniture - Armando & Filhos Lda, em Paços de Ferreira; Carlos Faria, designer da Opostos, outra empresa pacense; e Telmo Carvalho, natural de Lousada e docente na Escola Superior de Estudos Industriais e de Gestão.
Apesar dos percursos profissionais distintos, as opiniões destes designers são sobretudo convergentes quando se fala sobre o estado do design de mobiliário na região. É inevitável que as empresas recorram ao design para diferenciar o produto. Não é pelo preço que conseguirão competir no mercado actual, garantem.
Com ateliê aberto há 10 anos em Paços de Ferreira, o recentemente premiado com o Red Dot Design Award: best of the best 2010 desenvolve 90% do seu trabalho em torno do design de mobiliário. Curioso é o facto de Rui Alves nunca ter trabalho para ou com a indústria da Capital do Móvel. Recentemente chegou a procurar uma empresa pacense no sentido de desenvolver o protótipo de um banco, mas acabou por não ter grande apoio nem feedback e acabou por fazê-lo numa empresa de Famalicão. "É esta mentalidade e este apoio logístico e técnico que sinto falta aqui no concelho", explica. "Era fantástico que Paços de Ferreira, que tem um know-how inacreditável a trabalhar a madeira, pusesse isso à disposição dos designers", defende Rui Alves, dando como exemplo de sucesso o sector da cortiça.
As ideias são partilhadas por Paulo Ramunni. O portuense está há 17 anos em Penafiel onde tem uma pequena indústria. Desenha, produz e estabelece parcerias para comercializar os produtos, destinados à classe alta e média-alta, tendo a sua marca representada em cerca de 20 países. Ramunni acredita que já não é possível uma fábrica trabalhar sem design. "Seria impensável ter máquinas de 200 mil euros e depois não contratar um designer", afirma. Mas por outro lado, acredita que estes ainda são muito usados para copiar. Na região, as empresas são tecnicamente capazes, só pecam pela formação humana. E depois contratam designers como "desenhadores".
Dentro das empresas as opiniões não são muito diferentes. Carlos Faria está na Opostos, em Penamaior, há 14 anos. Nessa altura a antiga Móveis Tony mudou o seu percurso investindo no design. Agora, todos os anos lança uma nova colecção. "Hoje já há consciência de que o papel do designer é fundamental. Mas compreendo que às vezes muitas empresas não saibam de que forma investir no design", explica.
Quando compara o panorama actual com o de há 15 anos, Paços de Ferreira mudou muito, explica Carlos Faria. Mas a consciência é a de que ainda há muito trabalho pela frente. "O design pode ser um investimento alto, mas pode ficar mais caro à empresa não fazer esse investimento ou mesmo adiá-lo", defende. Por isso, crê que as indústrias que ainda não investiram no design vão fazê-lo em pouco tempo.
Da mesma forma, Ana João Silva, da AM Classic Furniture, acredita que, apesar de a aposta ter vindo a aumentar, ainda há poucas empresas com designers licenciados, o que se nota no produto e na própria divulgação. A licenciada em design industrial de 31 anos foi aposta desta empresa pacense há cinco anos. O gabinete está agora prestes a ser expandido.
A mentalidade, explica a jovem lisboeta, tem vindo a mudar, e Paços de Ferreira, que tem experiência e o know-how a trabalhar a madeira "devia arriscar mais e marcar a diferença com o objectivo de encontrar a sua identidade". "Isso passaria também pelo design", afirma Ana João.
