O Tribunal do Trabalho de Aveiro condenou o Centro Hospitalar do Baixo Vouga (CHBV) a pagar uma indemnização de 15 mil euros por não ter contratado uma mulher que pediu dispensa de turnos para amamentar o filho.
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A decisão ainda não transitou em julgado e o CHBV, que reúne os hospitais de Aveiro, Águeda e Estarreja, deverá recorrer, apurou o JN junto de fonte hospitalar.
O caso aconteceu em 2018 e levou a um processo judicial, que teve sentença há dias. Agna Oliveira, de 44 anos, alegou que o CHBV não a contratou para o lugar de assistente operacional, para o qual havia sido selecionada por concurso público, por ter requerido o direito a amamentar o filho, então com 19 meses, não fazendo turnos da noite como se esperava. Segundo a própria, na ocasião a enfermeira diretora disse-lhe, num tom "ameaçador e discriminatório", que deveria ter sido "desclassificada" por não poder trabalhar por turnos e que seria um "prejuízo para o hospital".
"Vexada e humilhada"
O tribunal considerou que Agna "foi discriminada no acesso ao emprego por ter exigido os direitos que a lei lhe conferia em virtude da sua condição familiar de lactante". Se o CHBV entendia que o atestado apresentado para justificar a amamentação apenas "emitia um juízo de conveniência" e não certificava uma "necessidade" para a saúde da mãe ou criança, "o que devia ter feito era contratar" e depois pedir ao tribunal para apreciar o caso. E não recusar a contratação.
O tribunal deu ainda como provado que a enfermeira diretora "agiu de forma autoritária e áspera, não mostrando abertura para qualquer solução". E que, na sequência deste caso, a queixosa "sentiu-se vexada e humilhada na sua dignidade de mulher e de mãe", tendo de tomar medicação para a ansiedade e depressão. Agna imigrou do Brasil há 12 anos. Licenciou-se em Gestão e em Enfermagem e, em Portugal, fez mestrado em Administração e Gestão Pública (Recursos Humanos).
O tribunal condenou o CHBV a pagar 15 mil euros por danos não patrimoniais. Agna espera que a decisão ajude outras mulheres. O CHBV, disse, "vai pensar muitas vezes antes de recusar um direito a uma parturiente, uma lactante ou uma mulher que tem filhos". O Conselho de Administração do CHBV não comenta a decisão, porque o processo ainda não transitou em julgado. Fonte hospitalar adiantou ao JN que vai recorrer. v
Proteção consagrada na Constituição
A proteção da maternidade e da paternidade como valores sociais está consagrada na Constituição, lembrou o tribunal. No artigo 68.o é atribuído às mulheres o direito a especial proteção na gravidez e após o parto, tendo as trabalhadoras ainda direito a dispensa do trabalho por período adequado, sem perda da retribuição ou regalias. O Código do Trabalho regula a atribuição às mães e aos pais de direitos de dispensa de trabalho, de acordo com os interesses da criança e as necessidades do agregado familiar, incluindo a dispensa para amamentação (artigos 47.o e 48.o).
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Direitos distintos
O tribunal deu como provado que o CHBV tem ao serviço mulheres "que estão a amamentar os filhos e que beneficiam da redução de horário para o efeito e dispensa de trabalho noturno". Mas a algumas "só permitiu o exercício de tais direitos após intervenção da CITE", a Comissão para Igualdade no Trabalho e no Emprego.
Empregos precários
Se tivesse sido contratada, Agna Oliveira teria a remuneração-base de 600 euros. Desde aquela situação, só teve empregos precários.
Amamentou até aos três anos
O filho de Agna Oliveira "mamou durante três anos, dois meses e 15 dias", conta a mãe, que considera que a amamentação tem grandes benefícios para a saúde e bem-estar do bebé.