Primeiros dois néctares certificados são uma edição limitada de 520 garrafas numeradas. Objetivo é promover a história e a ancestralidade transmontana.
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Os romanos sabiam-na toda. À falta de melhor tecnologia para fabricar vinho próximo das vinhas, escavavam os lagares nas fragas. Muitos deles em Valpaços, o concelho do país com maior concentração destas originalidades. Cerca de 120 já foram identificados e estudados. E, desde este mês, há também um vinho feito num destes lagares. O "Calcatorium" é o primeiro certificado e rotulado em Portugal.
Nem todos os lagares rupestres do concelho de Valpaços serão do tempo da ocupação romana, pois foram identificadas sete tipologias diferentes, mas no caso do de Santa Valha, onde foram pisadas as uvas que deram origem ao "Calcatorium", o arqueólogo Pedro Pereira diz que "será certamente medieval e com algum grau de certeza poderá ter sido romano, de instalação inicial". É que "há material romano e um castro romanizado próximos", bem como "uma larga ocupação deste espaço, pelo menos, até à alta Idade Média".
"Fez-se história"
A experiência de recuperar um processo único e ancestral de vinificação correu tão bem que a enóloga da Comissão Vitivinícola Regional de Trás-os-Montes, Ana Alves, não hesitou em dizer que este mês "se fez "história". E não só para Valpaços, pois com o denominado "vinho de lagar rupestre" pretende-se "promover os lagares, a história e a ancestralidade da região transmontana".
Um objetivo que é partilhado pela Associação de Vitivinicultores Transmontanos, cujo presidente, Augusto Lage, reforça que há que "colocar Valpaços no mapa da enologia, da cultura e do turismo".
Único e ancestral
"Um dia haverá quem venha aqui pagar para poder pisar uvas nestes lagares e levar umas garrafas", prevê.
Ana Alves espera que este processo "único e ancestral" de vinificação, que foi oficialmente reconhecido como método tradicional trasmontano, o ano passado, possa ser visto pelos produtores da região como uma oportunidade.
A ideia é que aproveitem a "ancestralidade e identidade da região" para fazerem "um produto de referência" para Trás-os-Montes.
Ainda segundo Augusto Lage, há a necessidade de classificar os lagares rupestres, não só para os proteger e preservar, como para, mais tarde, tratar de requerer a sua classificação como Património Mundial.
Pisadas a pé
Um tinto e um rosé certificados
Na vindima de 2018, quase uma tonelada de uvas colhidas numa vinha com mais de 50 anos foi depositada num lagar rupestre de Santa Valha. De acordo com Pedro Pereira, foi eleito por ser o mais "interessante". Ainda são visíveis, lateralmente, "zonas de estabelecimento de uma prensa mecânica" e uma série de "veios escavados na rocha para o escoamento de água". As uvas foram pisadas a pé e o mosto resultou em 560 garrafas numeradas de um tinto e de um rosé. A primeira vai ser oferecida ao presidente da República. Ana Alves diz que o objetivo é fazer uma nova lagarada na vindima deste ano.