Santa Casa da Misericórdia instaurou 24 procedimentos disciplinares após pré-aviso de greve e exigência de condições para utentes. Sindicato denuncia perseguição a profissionais.
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A Santa Casa da Misericórdia de Guimarães instaurou processos disciplinares a 24 trabalhadores do lar Rainha D. Leonor, cerca de um terço dos 70 profissionais da instituição, uma semana depois de ter recebido um pré-aviso de greve. Algumas cartas referem que o motivo do processo disciplinar foi uma reunião ocorrida a 11 de maio em que os trabalhadores exigiram mais condições. Outras cartas apenas informam da abertura do procedimento.
António Delgado, funcionário na área da limpeza, trabalha no lar há dois anos e está suspenso "por ter sido iniciado processo disciplinar", pode ler-se na carta que recebeu da Santa Casa. "Para mim, foi uma surpresa. Já trabalho desde os meus 15 anos e nunca me aconteceu uma coisa destas na vida", afirma, desconhecendo os motivos do processo.
Já Cristina Alves, trabalhadora do lar há 20 anos, recebeu uma carta na qual o procedimento é justificado com "acontecimentos do pretérito dia 11 de maio, os quais constituem a prática de infração disciplinar". Foi nesse dia que ocorreu a reunião entre trabalhadores e diretora do lar, onde foram feitas várias queixas ao funcionamento dos serviços. Nesse dia já tinha sido entregue o pré-aviso de greve (datado de 5 de maio) e os procedimentos disciplinares começaram a surgir a 14 de maio.
As principais queixas do dia 11 foram entregues por escrito à diretora, numa carta onde se lê que "falta pessoal em todas as áreas", o que se traduz em prejuízos para a higienização e lazer dos utentes. Além disso, são apontadas deficiências ao plano de contingência: "Os colegas afetos à ala de isolamento de utentes com suspeita de contágio por covid prestam assistência, em simultâneo, a outras alas e utentes que não se encontram em isolamento, em tarefas como higiene e alimentação".
forma de repressão
Para o CESP, o sindicato do setor, os procedimentos disciplinares são uma forma de "repressão, opressão, censura e perseguição" que visa limitar a liberdade sindical na instituição: "Perante a marcação da greve, a administração respondeu aumentando a perseguição aos trabalhadores, movendo dezenas de processos disciplinares indevidos".
O JN questionou a Santa Casa sobre os motivos dos processos disciplinares, mas apenas recebeu um comunicado onde se lê que serão objeto de procedimentos os comportamentos "que se revelem violadores dos deveres laborais, mormente os que possam pôr em causa o bem-estar, a saúde e a segurança dos utentes ou de qualquer outro colaborador".
A instituição diz que teve uma conduta "reconhecidamente exemplar no combate à pandemia" e que é "sucessivamente ameaçada com greves, queixas à ACT e Segurança Social, apesar da absoluta falta de fundamentos de quem recorre a esses meios".
Até hoje, não há relato de qualquer elogio público ao trabalho daquele lar no combate à pandemia. Pelo contrário, uma inspeção da Segurança Social ocorrida ali em outubro, aquando de um surto de covid na instituição, detetou 34 falhas no plano de contingência, entre as quais a falta de pessoal, de higienização e distanciamento.