Não é pelas regalias, que dizem ser poucas, que lá estão. Alunos entregam-se ao espírito de missão e os mais velhos ajudam os mais novos.
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"Não é um peso na vida ou uma perda de tempo, sou voluntário e estudo ao mesmo tempo com gosto, não sou obrigado". Manuel Marçal, 25 anos, é um dos 33 elementos estudantes do corpo ativo da Associação dos Bombeiros Voluntários da Sertã, uma das corporações com mais estudantes do país. Os dados são confirmados pelo comandante, Alexandre Silva: dos 105 bombeiros voluntários, 33 estudam, entre o Secundário e o Ensino Superior, a frequentar licenciaturas em 37 áreas diferentes ou mestrados.
Manuel Marçal, que integra o dispositivo de combate a incêndios, licenciou-se na Universidade de Coimbra em Economia e está no terceiro ano de Direito. "Não nego que o que se ganha no verão, cerca de 1000 euros por mês me ajuda nos custos com os estudos, mas essa não é a minha motivação principal. Felizmente, os meus pais podem sustentar-me", esclarece o bombeiro.
A Cidade dos Estudantes dista da Sertã pouco mais de uma hora, pelo que, frisa, "sempre deu para cumprir as 32 horas mínimas por mês no quartel". Na altura das frequências ou exames, esclarece Liliana Mendes, de 22 anos, finalista de Contabilidade no Instituto Superior de Contabilidade e Administração em Coimbra, "é sempre possível fazer trocas de serviço no quartel".
Bom espírito
A jovem destaca "o bom espírito" que se vive na corporação. "Temos colegas mais velhos que nos ajudam nos estudos, alguns que tiraram os mesmos cursos e que têm valências acrescidas para ajudar". "Os bombeiros voluntários, para efeitos de permanência na situação de atividade no quadro, têm de ter mais de 18 anos, estão obrigados a uma prestação anual do tempo mínimo de 275 horas de serviço operacional, sendo, no mínimo, 140 horas de socorro, simulacro ou piquete e 70 horas de formação e instrução". Alexandre Silva frisa que essa obrigatoriedade é cumprida "sem problemas". Porém, quando surge "alguma situação, temos a sorte de ter várias áreas do conhecimento, todos participam".
Para as famílias, "sabem que os filhos estão num local de bons comportamentos". Por exemplo, "os alunos com mais dificuldades são mais ajudados e criamos um donativo para os estimular a terem boas notas", acrescenta, orgulhoso, o comandante.
Contudo, queixam-se os voluntários estudantes, as regalias são poucas. "Só têm apoio nas propinas os voluntários no quadro de comando, o que acontece com três de serviço efetivo. A licenciatura acaba antes", aponta Pedro Farinha, 21 anos, finalista na licenciatura em Ciências do Desporto e que vai para mestrado em Biocinética. "Conheço poucos aqui que são bombeiros pelas regalias".
Sentido de missão
Estudantes ficam até final da época de incêndios
O Governo prolongou o período crítico de incêndios até 10 de outubro, no âmbito do Sistema de Defesa da Floresta, devido à previsão de tempo seco e quente. "Muitos dos estudantes já disseram que vão ficar até ao final da época de incêndios", diz o comandante Alexandre Silva. O estatuto de bombeiro voluntário permite que as faltas às aulas, desde que motivadas pela comparência em atividade operacional, sejam justificadas pelo comandante. Os voluntários têm ainda a possibilidade de poder escolher as aulas a frequentar, consoante os horários disponíveis.
Curiosidades
105 elementos tem a corporação dos Bombeiros Voluntários da Sertã, dos quais 33 são estudantes.
Sempre fiéis
Se um dia estes alunos arranjarem trabalho fora da região, dizem que é com "muita pena" que deixam o quartel. "Se arranjarmos trabalho na zona, continuaremos a ser bombeiros", asseguram.
Algumas benesses
Os bombeiros-estudantes têm direito a época de exame especial, entre outras regalias, e ao pagamento de cerca de 50 euros por 24 horas de atividade. "São poucas as regalias usufruídas, deveria olhar-se para este panorama com outros olhos. O que será de muitos dos quartéis do interior despovoado se não forem estes jovens", apela o comandante.