Um movimento de cidadãos de Miranda do Douro, independente e apartidário, lançou um Manifesto Cultural da Terra de Miranda com o objetivo de reunir assinaturas e reclamar junto da EDP parte da receita da venda de três barragens do Douro Internacional.
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A transação foi anunciada pela empresa no conjunto de um pacote de seis barragens, onde se incluem ainda as de Foz Tua, Baixo Sabor e Feiticeiro, por um montante de 2210 milhões de euros. "As receitas fiscais geradas por esta transação, pela tributação dos lucros anuais destas barragens, bem como o IVA da venda da energia, beneficiam apenas o poder central", refere o Movimento, do qual faz parte a pintora Balbina Mendes.
As barragens hidroelétricas de Miranda, Picote e Bemposta, localizadas no troço do Rio Douro que atravessa o Planalto Mirandês, geram cerca de um terço da totalidade da energia hidroelétrica produzida pela EDP e são das mais rentáveis unidades do país, mas os mirandeses consideram que a terra pouco ganha com elas.
"Na Terra de Miranda não fica praticamente nada. Neste modelo injusto e caduco, o que sobra para a região em que são explorados os recursos naturais são os impactos ambientais negativos da construção e da exploração das barragens. No centro da cidade de Miranda do Douro e no coração das Arribas do Douro subsiste uma pedreira de grandes dimensões, de onde foi retirado o granito para as barragens, a céu aberto e ao abandono, que nunca foi reparada. O mesmo acontece em Picote e Bemposta. Esse modelo de apropriação da riqueza gerada para o poder central e do abandono das populações aos respetivos custos contraria os valores da justiça, da equidade, da solidariedade e da coesão territorial", fazem saber os subscritores deste manifesto.
O Movimento defende "uma reafectação de recursos e a sua utilização no investimento mais reprodutivo, transformando a Terra de Miranda num centro de produção cultural e de atração do turismo cultural, histórico e ambiental, que serão, por sua vez, fatores de sustentabilidade e de prosperidade da Terra de Miranda".
Apesar de muitas entidades ganharem com a construção de barragens o mesmo não sucede com as terras que as acolhem, que recebem apenas um valor mínimo da Derrama Municipal.
O Movimento descreve no manifesto vários exemplos dos que ganham com as barragens. A empresa concessionária da exploração das barragens, que arrecada os lucros que anualmente produzem estes equipamentos e pela mais-valia extraordinária que vai auferir com a venda das concessões; o Estado Português, que irá cobrar 5% daqueles 2210 milhões de euros, a título de Imposto do Selo, pela venda das barragens. Esse imposto foi sempre receita dos municípios e apenas deixou de o ser por decisão do poder central a partir de 2003; o Estado ganha ainda ao receber também o IRC sobre os lucros da concessionária resultantes dessa operação e por receber o IRC dos lucros da concessionária, gerados por estas barragens; e ainda o Estado que anualmente recebe centenas de milhões de euros do IVA da venda da eletricidade produzida por estas barragens; também a Câmara Municipal de Lisboa ganha, dado que a Derrama Municipal é paga em função do domicílio dos trabalhadores da concessionária, que ao longo dos anos os foi deslocalizando para outras partes do país, "deixando na Terra de Miranda apenas a exploração dos recursos".
O Movimento cita ainda a Agência Portuguesa do Ambiente, que cobra uma taxa à concessionária, designada de Taxa de Recursos Hídricos, em função do número de metros cúbicos que passam por estas barragens e o Fundo Ambiental, para que vão metade das receitas daquela taxa e a quem cabe a reposição do equilíbrio ecológico nas margens do rio.