Desporto Escolar Sobre Rodas já fez chegar às escolas do país quase 18 mil veículos de duas rodas. PéPedal, em Aveiro, foi premiado pelo trabalho de promoção da mobilidade ativa.
Corpo do artigo
André, dez anos, começou a pedalar quando frequentava o Pré-Escolar e sai no pelotão da frente que parte da Avenida de Lourenço Peixinho para a escola do 1.º Ciclo da Glória, no centro da cidade de Aveiro. Ele e os colegas que seguem de bicicleta vão juntar-se mais adiante a outras crianças que circulam a pé. São os “passageiros” dos comboios PéPedal, um projeto premiado da CiclaAveiro, que quer “semear” nos pequenos o gosto e o hábito pela mobilidade ativa. Por todo o país, estão a surgir cicloexpressos e projetos municipais para ensinar as crianças a usarem a bicicleta. E, a nível nacional, os programas Desporto Escolar (DE) Sobre Rodas e Comunidade já entregaram quase 21 mil bicicletas e capacetes a estabelecimentos de ensino público.
As 17.800 bikes e capacetes entregues até julho do ano passado ao abrigo do DE sobre Rodas seguiram para 871 escolas. Segundo o Ministério da Educação, Ciência e Inovação, o que começou como projeto-piloto acabou por se tornar “estruturante", reforçando o “caminho para uma mobilidade mais sustentável”.
Com bicicletas, as escolas desenvolvem depois atividades junto da população escolar, “com especial foco nas idades mais novas (2.º Ciclo do Ensino Básico)” e procuram que haja interligação com outras áreas disciplinares, “para a promoção de atividades no âmbito da mobilidade ativa e sustentável, como resposta à mudança de comportamentos e à criação de hábitos mais sustentáveis”, explica o Ministério. Sempre que possível, acrescenta, “será potenciada a interação dos projetos com iniciativas a decorrer nas escolas de 1.º Ciclo do mesmo agrupamento”.
Até ao momento, o projeto já envolveu 23.041 alunos, sendo que neste ano letivo estão abrangidos 7918 alunos – dos quais 1685 do 1.º Ciclo, 3936 do 2.º Ciclo, 1990 do 3.º Ciclo e 307 do Ensino Secundário.
Já no âmbito do projeto DE Comunidade, que alarga a oferta a outros destinatários, como famílias, pessoal docente e não docente, foram entregues, até dezembro de 2024, três mil bicicletas e capacetes, a 200 agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas.
Têm maquinista e passe
Em Aveiro – onde o projeto PéPedal conta este ano letivo com 13 linhas, que permitem a dezenas de crianças dos três aos dez anos irem, uma ou duas vezes por semana, de bicicleta ou a pé para as escolas da Glória, Vera Cruz, Barrocas e Santiago, que integram o Agrupamento de Escolas de Aveiro – a “alegria dos mais pequenos é fantástica”, assegura Maria Miguel Galhardo, presidente da CiclAveiro.
Ao chegar à escola, as gémeas Mar e Luz, de sete anos, corroboram. Dizem que gostam “muito de andar de bicicleta e de fazer exercício” e não é raro usarem este meio de deslocação para irem à piscina. E nem uma roda furada nesta viagem lhes tirou o ânimo.
A acompanhar estes meninos e meninas vão “maquinistas”, pais que se voluntariam para garantir a segurança e guiar os percursos através das ruas da cidade. Para embarcar, é preciso um cartão, uma espécie de passe onde se acumulam pontos, que os “passageiros” podem trocar por produtos e experiências em "amigos”, como são chamadas as 23 lojas de comércio local e associações parceiras.
Aplicação móvel
Recentemente, o PéPedal foi premiado pelo projeto No PLANet B da Assistência Médica Internacional, recebendo um financiamento de cerca de 12 mil euros, que os dirigentes vão aproveitar para criar uma aplicação móvel, para que a “validação do passe, atribuição do ponto e troca no amigo [parceiro comercial] seja feita de forma integrada”, algo que facilitará, também, a recolha de dados.
Sementes
Mas tanto como o financiamento, para a CiclaAveiro valeu o “reconhecimento”. “Foi muito importante dizerem-nos que o projeto tem mérito, que a mobilidade escolar merece destaque e ser apoiada, para as pessoas poderem trabalhar de forma consistente e regular”, diz Maria Miguel Galhardo.
A presidente da CiclAveiro e os outros pais sabem que as “sementes” que estão a “plantar” nas crianças podem fazer a diferença na mobilidade do futuro. Sabem que “é difícil e demorado”, que estão a trabalhar agora para um “impacto” que se sentirá "só nas próximas gerações", mas insistem em “contagiar” as famílias.
Ajuda a não se perderem
Acreditam que as crianças que vão a pé ou de bicicleta podem aprender mais facilmente o percurso, criam referências no espaço público para o caso de se perderem ou ficarem sozinhas e estabelecem laços na rede de amigos do PéPedal, “referências de proximidade na comunidade que ajudam ao desenvolvimento dos mais pequenos”. Vão “a conversar, convivem e têm interação social”. Pelo contrário, “uma criança, sozinha, num carro, não desenvolve ferramentas de autonomia”, alerta Galhardo.
Para a líder da CiclaAveiro, é preciso “sensibilizar e continuar a fazer alterações” que permitam usar as duas rodas com facilidade. Uma das dificuldades com que se deparam em Aveiro, por exemplo, é que as bicicletas não podem ser transportadas nas carrinhas que buscam as crianças nas escolas para as levarem para o ATL, algo que dissuade muitos pais. Naquele dia, um dos passageiros regulares teve de faltar. Depois da escola seguia para o ATL “e a mãe não conseguia ir buscar a bicicleta” no final do dia à escola, conta Maria Miguel Galhardo, revelando que a criança “ficou triste”.
Tem de haver “condições para as pessoas poderem escolher, em liberdade, a forma como se deslocam”, defende Galhardo. “Hoje vivemos uma ditadura da mobilidade, muitos não têm alternativa senão pegar no carro, porque tudo está feito nesse sentido”, lamenta, defendendo que é preciso “quebrar este ciclo, por razões ambientais, de saúde e bem-estar das pessoas e pelo impacto que isso tem na comunidade e no território”.
Adesão cresce em Lisboa
Em Lisboa, como noutras zonas do país (ler exemplos ao lado), estão a ser criados projetos que incentivam o uso das duas rodas. No caso da capital, neste ano letivo, o Programa Municipal de Comboios de Bicicletas abrange cerca de 430 crianças, do Pré-Escolar ao 9.º ano, que usam uma das 27 linhas existentes para chegarem à escola.
A adesão ao programa tem vindo a aumentar. No primeiro ano (2019/2020), havia somente 35 inscritos, mas no ano seguinte o número disparou para 211 e tem vindo sempre a escalar até atingir, em 2024/2025, 431 inscritos e 34 escolas.
Em média, refere a Câmara Municipal, os alunos lisboetas “percorrem 4,5 km em cada circulação”.
Outros casos
Braga
O projeto Rodinhas na Quinta ensina crianças, dos três aos dez anos, a andar de bicicleta na Quinta Pedagógica de Braga, promovendo novas aprendizagens, exercício e experiências ao ar livre. O acesso faz-se através dos colaboradores da Quinta.
Albergaria
O MOB.A, programa municipal de disponibilização gratuita de bicicletas de Albergaria, foi à EB 1 de S. João de Loure em março para desenvolver uma atividade de promoção da mobilidade suave, que envolveu 87 estudantes do 2.º e 3.º ciclos.
Águeda
O “Pedal in Águeda”, programa que inclui atividades realizadas pela autarquia em torno das modalidades de bicicleta, como o “Bicicleta vai à Escola”, “Escolas com pedal” e “Águeda Bike 4 Kids”, disponibilizou 70 bicicletas à comunidade escolar.