Moradores das ilhas que serão compradas pela Câmara do Porto mostram-se expectantes com a requalificação que será realizada. Autarquia garante que as 39 famílias regressam após as obras.
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Nas seis ilhas da Lomba, na freguesia do Bonfim, no Porto, já todos sabem que vão mudar de senhorio e que as casas serão em breve compradas pela Câmara do Porto que as quer reabilitar, dando-lhe condições de conforto, salubridade e higiene, numa operação que custará 7,4 milhões de euros. Todos concordam com "as necessárias melhorias", mas também temem não voltar depois das obras para as suas casas ou que as rendas sejam aumentadas.
Quando anunciou a medida, a 20 de dezembro, a Câmara do Porto assegurou que ninguém seria deslocado e que, após a reabilitação, os residentes regressariam às suas habitações.
"As casas são pequenas mas dão para viver. Eu nasci aqui na casa que era dos meus pais e onde criaram sete filhos", conta António Soares, de 62 anos, residente na ilha do Lourenço. A habitação tem dois quartos, uma cozinha, uma sala de estar e uma casa de banho feita há alguns anos. A vizinha Leocádia Rosa, de 77 anos, recorda que, antigamente, a casa de banho era coletiva e ficava no exterior, no meio da ilha.
Apesar da precariedade, todos os moradores garantem que não trocavam o lugar onde vivem há décadas por nenhum outro da cidade do Porto. "Somos como uma família. Com uma população envelhecida, há entreajuda entre vizinhos", acrescenta António, apontando para a churrasqueira que construiu e muito utilizada nos arraiais de S. João, antes da pandemia.
"Obras necessárias"
"As obras são necessárias porque as casas estão muito velhas. Andaram aqui umas meninas há cerca de dois anos a fazer umas perguntas mas nunca mais se soube de nada. Agora dizem que a Câmara vai comprar a ilha", explica Leocádia.
Neste projeto-piloto, a Autarquia fez o levantamento desta zona da Lomba onde encontrou 19 ilhas, um total de 261 fogos e 104 famílias. As condições de habitabilidade são em tudo semelhantes às de outras ilhas na cidade: 24 agregados vivem em casas em mau estado de conservação, 15 em tipologia inferior à adequada e 24 famílias ainda não têm cozinha ou casa de banho dentro de casa.
Manuela Sousa fala exatamente disso, das divisões pequenas da sua casa, enquanto prepara o almoço numa cozinha improvisada num avançado que foi construído para a habitação ter mais espaço.
"Vim para aqui morar quando casei, há 44 anos e apesar da ilha estar assim, com muitas casas vazias e em ruína, gosto disto. É esse o meu grande medo, que a Câmara para fazer as obras nos mande para um bairro social e que não voltemos. O meu medo é depois não voltar", afirma a mulher de 68 anos. O marido tem 72 e a sogra 92. Pagam 22,30 euros de renda.
Do total das 19 ilhas, a Câmara irá comprar seis, localizadas na Travessa da Lomba e nas ruas do Lourenço e de Vera Cruz. O objetivo é congregar estes espaços, aumentando a tipologia das habitações com as áreas das casas que estão devolutas. Assim, as 59 casas existentes resultarão, após a transformação, em 41. Serão criadas novas frentes de fachada e as zonas de jardim interior também ficarão maiores. O vereador do Urbanismo da Câmara do Porto, Pedro Baganha, garante que os 39 agregados ali residentes voltarão para a ilha, para casas com maiores áreas e até sobrarão habitações para novos moradores.
Projeto para replicar
"O importante é que seja gente boa, se não não fazem cá falta. Mas é preciso intervir aqui, até por uma questão de limpeza, pois as casas vazias geram bicharada e mau cheiro", considera Maria de Lurdes Costa, que reside junto à Rua de Vera Cruz numa casa que o marido foi melhorando ao longo dos anos e onde gastou "muito dinheiro para conseguir viver em conforto".
Na centenária mercearia local, propriedade de Maria Pinto, fala-se do assunto. Há quem suspire de desalento por morar em ilhas que ficaram fora do projeto-piloto.
A Autarquia diz que a experiência pode ser replicada noutras zonas da cidade, numa estratégia de regeneração habitacional das ilhas e de aumento do bem-estar das populações envolvidas, sempre que haja financiamento por parte do Estado.
Para já, das seis ilhas, quatro reúnem condições legais para avançar para candidatura para reabilitação integral até porque os respetivos proprietários demonstraram interesse em alienar o seu património.