Autarca e amigos contrataram advogado e família abriu-lhe conta bancária.
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Manuel Cruz foi preso por ter matado a mulher, mas só esteve preso 34 meses, porque fugiu. Viveu 16 anos no mato, e foi agora detido. A família abriu-lhe uma conta e o presidente da Junta de Anissó contratou um advogado.
Num dia de um calor abrasador, a esplanada do café principal da freguesia de Anissó, em Vieira do Minho, está bem composta, sobretudo com emigrantes que queimam os últimos dias de férias. "Ouvimos falar do caso pela televisão", diz Paulo Freitas, que logo acrescenta: "Mas todos nós sabíamos que ele andava por aí". Refere-se a Manuel Fernando Cruz, o homem que esteve 16 anos escondido da Polícia em grutas e montes de Vieira do Minho.
Refugiam-se nos factos tornados públicos para falar do caso e, perante a pergunta se estariam disponíveis para o ajudar a recomeçar uma nova vida, são unânimes: "Sim, claro". Por isso mesmo, alguns familiares já criaram uma conta solidária para o ajudar, que vai nos 500 euros.
"O dinheiro que conseguimos veio, sobretudo, da família e dos amigos", conta a prima Aida Silva. "As pessoas dizem que sim, mas depois não dão nada. Há até quem diga que ele está melhor lá dentro", indigna-se a familiar, que contem as lágrimas sempre que recorda estórias com Fernando: "Trocávamos bilhetes. Ele pedia-me comida e dinheiro; eu dizia-lhe onde deixava as coisas e queria saber como ele estava". Se a prima ainda não o foi ver à prisão - "não tenho coragem", diz - , já o irmão vai lá todas as semanas: "Ele está com esperança de sair, mas não tem nada contra a prisão, diz que tem sido bem tratado".
Nesta altura, há 500 euros na conta solidária, mas Aida Silva tem um objectivo: mil euros. "Se 15 pessoas derem um euro, já são 15 euros e, devagarinho, chega-se lá". Para os interessados, há uma conta disponível para receber depósitos. Explicando que, ao contrário do que alguns juristas pensam, a pena de Manuel Cruz não prescreveu (ver caixa), o advogado contratado pelo presidente da Junta de Anissó e alguns amigos, Vítor Lima Ferreira, diz ter um trunfo na manga: uma testemunha, que assegura ter visto o que realmente se passou a 15 de Agosto de 1991 e, por isso, vai interpor um recurso extraordinário de revisão de sentença.
"É uma jovem que estava perto, numa fonte, e que, pouco depois, foi para o Porto", conta. Segundo o advogado, "ela nega que a única testemunha arrolada para o caso tenha estado no local" e terá contado que viu Manuel reagir com uma varada na mulher, "depois de ela lhe ter atingido com duas varadas na cabeça. Poderia até pôr-se em causa a legítima defesa". "Em termos abstractos, este homem ainda terá sete anos e dois meses de prisão para cumprir", diz o advogado do Porto. No entanto, explica que apesar da condenação de 10 anos de prisão, o seu cliente beneficiou de um perdão, que lhe suspendeu um ano e meio de pena. Beneficiando de um artigo que lhe retira metade da pena, e somando os dois anos e 10 meses que cumpriu antes de fugir da cadeia, só teria um ano e meio para cumprir".